A importância do Compliance Tributário

Compliance Tributário

Embora conte com quase 50 anos de existência, o Compliance ainda se mostra como uma área que precisa ser mais bem entendida para alcançar seu verdadeiro benefício. Criada por conta de uma crise de corrupção nos anos 70 e, no Brasil, foi internalizada com a assinatura do Acordo de Cooperação Intergovernamental – Decreto nº 8.506/15.

Compliance se traduz em um conjunto de regras para finanças e corporação; comércio e mercados; gestão de investimentos, análise econômica de riscos e, também, em conformidade tributária; por este motivo é impreterível que as empresas estejam atentas aos cumprimentos das regras de Governanças e, em especial, ao movimento do Fisco no que refere à Fiscalização dos Contribuintes.

Em 2022 temos como os itens mais fiscalizados as Notas Fiscais não escrituradas e a quebra de sequência na emissão de Notas próprias – um procedimento que pode parecer simples, mas que, em verdade, reside em um grande “calcanhar de Aquiles” para a maioria dos Contribuintes uma vez que, a não escrituração de Notas Fiscais implica em quebra de Regulamento do ICMS, possível falta de aproveitamento de créditos e, fora desta esfera tributária, possível problemas com o fornecedor.

É comum que as Notas Fiscais inutilizadas não sejam canceladas junto ao Fisco, chamando uma grande atenção para qualquer possível falha no controle e governança praticada pelo Contribuinte.

Ao falarmos de Compliance, é necessário entendermos que, no Brasil, vamos além do FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) e do Bribery Act – inclusive, mais severos que nossas regras nacionais – porém nosso complexo sistema tributário exige que as empresas estejam devidamente capacitadas e organizadas a revisar suas próprias atividades – com time próprio ou terceirizados.

Claramente as empresas hoje necessitam se munir não só de boa capacidade técnica, mas também de informações suficientemente bem analisadas para evitar não somente o contencioso tributário, mas também evitar pagamento a maior, duplicados ou atemporais – desde que houve a promulgação da nossa Constituição Federal – em 1988 – o Brasil conta com 377 mil normas tributárias editadas – sendo 32 mil só no âmbito federal – não  é em vão que nosso sistema tributário é considerado um dos mais complexos do mundo e que seu respectivo Compliance mereça uma atenção especial e time qualificado.

Neste sentido, um dos cenários mais comumente encontrados se refere a diferença entre as obrigações acessórias entregues pelo próprio contribuinte, como, por exemplo EFD X GIA, ou DCTF X ECD – tais inconsistências não são só evitáveis, como também apuráveis pelo próprio Contribuinte ao contar com uma equipe especializada que possa realizar esse crosscheck e apontar não somente as diferenças, mas também como ajustá-las e, possivelmente, evitá-las num futuro próximo.

Infelizmente, diferente de outros países, não há nenhum tipo de penalidade prevista aos Auditores Fiscais que exercem a fiscalização do poder de tributar do Estado – contando com 135,31 Bilhões de Reais divididos em 265.350 processos administrativos somente nas Delegacias da Receita Federal (ou seja, excluindo os processos Estaduais e Municipais), a lavratura de Autos de Infração e Imposição de Multa não só é um receio da maioria dos Contribuintes, como também é um ato administrativo que, mesmo sem análise minuciosa dos fatos e documentos, pode acontecer sem nenhum prejuízo para o Fisco.

O Compliance Tributário, quando bem-feito, evita o risco de questionamentos, uma vez que, o cruzamento de informações que tem como resultado consistências tende a não ser questionado e, portanto, fiscalizado.

Apresentado recentemente pelo TCU – Tribunal de Contas da União, o relatório de “Conclusões técnicas dos trabalhos realizados na gestão  Tributária Federal” deixa claro como, mesmo havendo falhas por parte da administração pública, o contencioso tributário vem crescendo no Brasil – são R$ 2,32 trilhões de Reais divididos em 17 milhões de “certidões de Dívidas  Ativas Federais – os números refletem sim um excesso e facilidade de Autuações, mas nos remete a quantidade de falhas passíveis pelo Contribuinte.

Na esfera Estadual e Municipal a consolidação de dados se torna quase impossível, isso porque parte dos Estados e Municípios sequer estão devidamente automatizados com relação ao contencioso tributário – mas verificam o Compliance de seus Contribuintes ativamente – com destaque a esfera Estadual, onde comumente as Secretarias da Fazenda Estaduais vem comunicando a Promotoria Estadual para abertura de investigações criminais- e possíveis processos pelo suposto não pagamento de tributo.

A Lei 8.137/90 em seu art. 1º e 2º traz os tipos penais contra a Ordem Tributária, e, de fato, há crimes de sonegação fiscal que, pela letra da Lei, pode ser oriundo da falta de diligência na realização do Compliance, uma vez que a inexatidão de Declarações, por exemplo, é uma infração fiscal passível de ser classificada como sonegação – ao levar isso em conta, em 2020 o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação) calculou R$ 417 bilhões de Reais classificados como sonegados – isso demonstra a disparidade e dificuldade dos Contribuintes em realizar suas obrigações principais e acessórias.

É importante ter em mente que o Brasil é um dos países com a tecnologia tributária mais avançada do mundo, bem como um dos maiores países com arrecadação sob litígio – não é difícil depreender a conexão existente entre essas duas informações, qual seja, a informatização e avanço tecnológico do Fisco tem gerado fiscalização, autuações e, consequentemente, maior gasto para o Contribuinte.

Se torna imprescindível que o Compliance tributário seja visto como uma vantagem competitiva para as empresas, a utilização de equipe especializada em identificar e evitar falhas nos procedimentos internos não só é um ganho para a empresa que adota essa visão e política, como um benefício social em não permitir que o erário se sobrecarregue.

 

Responsabilidade tributária atribuída aos Marketplaces e as medidas preventivas oriundas do Compliance

Em linha com o entendimento acima exposto, é de se ressaltar que no Estado do Rio de Janeiro houve a publicação de uma norma[1] atribuindo a responsabilidade tributária aos Marketplaces pelo não recolhimento de ICMS devido pelos lojistas cadastrados em sua plataforma.

A norma foi questionada por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADIN nº 0040214-33.2020.8.19.0000, tendo os julgadores do TJRJ considerado a norma Constitucional, mantendo assim a responsabilização do Market Place por inadimplementos dos lojistas.

Caso essa decisão permaneça, é importante que o setor se movimente e logo, cabendo ao time de Compliance Tributário adotar medidas para mitigar os riscos operacionais neste modelo de negócio

 

Nossa equipe se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.

Escrito por Beatriz Perin

[1] Artigos 15 e 18 da Lei nº 8.795/2020

Veiga Advogados consegue importante decisão no Tribunal da Bahia, reconhecendo a anterioridade anual para o recolhimento do DIFAL

Em que pese decisões do Tribunal da Bahia cassando liminares anteriormente concedidas, nossa equipe tributária conseguiu importante decisão e para um de seus clientes, grande player mundial no setor de Healthcare.

Há de se ressaltar que recentemente muitos Tribunais pelo Brasil suspenderam as liminares anteriormente concedidas aos Contribuintes; trata-se da primeira decisão favorável em Segunda Instância Baiana que se tem conhecimento.

Desde o início do ano diversos contribuintes vêm sofrendo com a atual insegurança jurídica, especialmente em relação ao ICMS-Difal. Com a publicação da LC 190/2022, opiniões foram divididas sobre a legalidade do início desta cobrança, levando, novamente, este tema para o judiciário – nosso objetivo é que os contribuintes possam usufruir dos preceitos constitucionais e sejam vedadas as práticas coercitivas de cobrança do imposto com base no Julgamento do RE 1287019/DF.

ESTADO DO PARANÁ CRIA O FUNREP QUE DIMINUI BENEFÍCIOS FISCAIS PARA CONTRIBUINTES DO ESTADO

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A partir de 1º de abril de 2022 o Estado do Paraná, por meio do Decreto nº 9.810, regulamentou o art. 11, § 5º da Lei Complementar nº 231/2020, para estabelecer uma nova despesa tributária que provavelmente não foi objeto de precificação no orçamento projetado para 2022 entre os contribuintes de ICMS.

Trata-se do FUNREP, Fundo de Recuperação e Estabilização Fiscal do Paraná, que tem como finalidade diminuir os efeitos decorrentes de recessões econômicas ou calamidade pública no Estado do Paraná.

O adicional se destina especificamente aos contribuintes paranaenses que utilizam incentivos e benefícios fiscais no Estado do Paraná, especialmente os benefícios e incentivos ligados a produtos alimentícios, equipamentos e implementos rodoviários, fabricante de móveis, insumos importados nos Portos e Aeroportos do Estado, dentre outros.

O valor será calculado a partir da aplicação de uma alíquota de 12% incidente sobre o benefício aproveitado no mês. Importante destacar que a não realização do depósito por três meses consecutivos ou não, poderá acarretar a perda definitiva dos benefícios e incentivos fiscais que estão em uso pelos contribuintes.

Vale lembrar que esta nova despesa poderá ser considerada como dedutível, o que reduzirá a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, isso quando o contribuinte estiver submetido à tributação calculada no lucro real.

Embora a cobrança esteja na iminência de entrar em vigor, ressaltamos que existem argumentos sólidos para que os contribuintes que se encontrem nesta condição não se submetam à mais essa exação.

Nossa equipe tributária se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.

GOVERNO FEDERAL PUBLICA DECRETO PARA REDUZIR À ALÍQUOTA ZERO O IOF-CÂMBIO

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Foi publicado ontem o Decreto nº 10.997/2022, que inicia a redução do IOF-Câmbio e estabelece que até 2029 o aludido imposto será como um todo estará submetido à alíquota zero.

O Decreto prevê, ainda, que nas liquidações de operações de câmbio para ingresso de recursos no País, inclusive por meio de operações simultâneas, previstas no Decreto nº 6.306/2.007, foram reduzidas à zero.

O novo Decreto prevê ainda que para demais operações tais como: de câmbio destinadas ao cumprimento de obrigações de administradoras de cartão de crédito ou de débito ou de bancos comerciais, operações de câmbio destinadas ao cumprimento de obrigações de administradoras de cartão de uso internacional, operações de câmbio para aquisição de moeda estrangeira em cheques de viagens e para carregamento de cartão internacional pré-pago, o IOF-Câmbio será diminuido de forma progressiva em 1% ao ano.

Com isso, as demais operações que não foram zeradas neste momento pelo Decreto até 2028 terão as suas respectivas alíquotas totalmente zeradas. Significa dizer que até 2029, como um todo, o IOF-Câmbio como um todo estará submetido à alíquota zero.

Cabe salientar que em 26.01.2022, o Governo Federal anunciou que a OCDE formalizou convite para que o Brasil ingressasse na entidade, que é uma organização que reúne as nações mais avançadas, livres e democráticas do mundo.

Em suma, os países que compõem a OCDE possuem algumas regras modelo de tributação internacional da renda, a ideia é criar um mecanismo de cálculo e recolhimento para que todas as empresas multinacionais obrigadas a cumprirem o novo modelo, paguem ao menos 15% de taxa de imposto de renda globalmente.

A redução do IOF-Câmbio, como está sendo feita, é um passo importante para que o Brasil seja reconhecido e aceito na OCDE.

Nossa equipe tributária se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.

Difal ICMS, entenda os atuais problemas e as principais medidas recomendadas.

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Quais os atuais problemas encontrados?

De acordo com o STF, para a cobrança do DIFAL é necessário Lei Complementar que a institua, ou seja,  decidiu-se que os Estados estão proibidos de exigir o ICMS Difal nas operações interestaduais com venda para não contribuintes do ICMS à partir de 2022.

Embora a decisão seja de Fevereiro do ano passado, o que deu ao Legislativo 10 meses para a criação de Lei que regulamentasse o Diferencial de Alíquota do ICMS, somente em 2022 que entrou em vigência a Lei Complementar 190/2022, alterando a Lei Kandir, ou seja – pelo princípio da anterioridade anual, não seria possível a cobrança de Tributo no ano de sua publicação.

Isso porque uma das maiores discussões no momento, por força de normas constitucionais, especialmente em relação ao princípio da anterioridade, art. 150, III, “b”, da Constituição Federal, garante que o tributo instituído em determinado exercício só poderá ser cobrado no exercício posterior, ou seja, o DIFAL só poderia ser exigido a partir de 01.01.2023.

Uma outra tese que também ganha força também se refere à legalidade do período de cobrança, conforme disposto no item “c”, do inciso III, do art. 150, da CF, cuja regra de cobrança só será válida a partir de 90 dias após a publicação da norma que instituiu a cobrança.

Muitos Estados tais como: Acre, Amapá, Espírito Santo, Goiás, Maranhão, Mato Grosso do Sul, dentre outros, já estão botando em prática a cobrança do DIFAL sem a observação dos limites acima mencionados, ou seja, além da cobrança ilegal esses estados também estão impedindo que os contribuintes circulem em seus territórios diante da falta de pagamento do Difal.

Por fim, porém não menos importante, ao observar a legislação de certos Estados, tais como: Alagoas, Bahia, Goiás, Minas Gerais, Pará, Paraíba, Paraná, Pernambuco, Piauí, Rio Grande do Sul, Rondônia, Santa Catarina, São Paulo, Sergipe e Tocatins, percebemos que estes entes instituíram uma sistemática diferente de cálculo, chamada de “base dupla” ou cálculo por dentro, que, em síntese, consiste em calcular do DIFAL utilizando-se de bases de cálculos distintas, o que ao final aumenta o valor do ICMS Difal a ser recolhido.

O que fazer diante deste cenário?

Diante do cenário acima apresentado, é importante que os contribuintes adotem uma postura ativa e ajuízem ações contra o Fisco para garantirem o seu direito ao não recolhimento do ICMS Difal durante o exercício de 2022 e de circularem livremente sem a necessidade de recolhimento deste imposto.

Importante sempre frisar que a tese está sendo amplamente aceita pelo poder judiciário, cujas decisões foram proferidas para assegurar o direito do contribuinte de não recolher o ICMS Difal no exercício de 2022 e tampouco de ter as suas mercadorias retidas pelo não pagamento deste tributo – inclusive a LC 190/22 já é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade.

Entendemos que a cobrança do DIFAL em 2022 não é possível e que isso representa uma economia importante para as empresas e seus clientes.

Nossa equipe tributária se coloca inteiramente à disposição para eventuais esclarecimentos.

Luís Eduardo Veiga                      Richard Búffalo                             Beatriz S. Perin

luis@veiga.law                                richard.buffalo@veiga.law       beatriz.perin@veiga.law

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CONDOMÍNIOS PODEM PROIBIR LOCAÇÕES DE IMÓVEIS RESIDENCIAIS POR MEIO DE PLATAFORMAS DIGITAIS E APLICATIVOS DE HOSPEDAGEM COMO AIRBNB

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Nos moldes em que funcionam, serviços de locação oferecidos por aplicativos como o Airbnb — hospedagem remunerada, com múltipla e concomitante locação de imóveis ou quartos por curto tempo e em contrato não regulado por legislação — não são considerados residenciais. Por isso, podem ser vedados por prédio residencial.

Com esse entendimento e por maioria de votos, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça em recente julgamento (Resp 1.819.075), negou provimento ao recurso de proprietários de três apartamentos de um edifício, contra decisão que determinou que eles se abstenham de oferecer alojamento e hospedagem mediante locação de quartos e prestação de serviços.

No caso, as locações foram feitas pelo Airbnb, aplicativo que conecta direta e virtualmente, anfitriões e hóspedes. Os demais condôminos reclamaram a alta rotatividade de estranhos, que ganhavam inclusive cópia da chave do portão de entrada, nas dependências do edifício.

Venceu o voto do ministro Raul Araújo, que divergiu do relator em voto que não aponta a natureza comercial dessa forma de locação, mas que afasta sua característica residencial, a partir de doutrina sobre o que se qualifica como residência (características que não se coadunam com eventualidade e transitoriedade).

No caso concreto, a convenção condominial do prédio prevê expressamente que o uso das unidades deve ser residencial. Por isso, a locação por Airbnb no caso gera desvirtuamento de finalidade. Fica o condômino obrigado a dar aos seus apartamentos essa mesma destinação: residencial, exclusivamente.

Seguiram o voto divergente do ministro Raul Araújo a ministra Isabel Gallotti e o ministro Antonio Carlos Ferreira.

Ficou vencido o relator, ministro Luís Felipe Salomão, para quem proibir a exploração econômica do próprio imóvel afronta o direito de propriedade garantido na Constituição. Logo, a decisão judicial e o pedido do condomínio afrontam o exercício do direito de propriedade.

Não participou do julgamento o ministro Marco Buzzi, que se encontrava em licença médica.


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Convenção de condomínio x Direito de propriedade

Durante o julgamento, os ministros ressaltaram que o caso não proíbe a oferta e uso de serviços por plataformas como o Airbnb, ou mesmo que, por meio dele, sejam fechados aluguéis por temporada. O incômodo do condomínio foi exatamente com o oposto disso: a alta rotatividade de hóspedes.

A maioria entendeu que é possível a extensão dos poderes da convenção de condomínio diante do exercício do direito de propriedade. “Realmente, não se trata de uma destinação meramente residencial. Foge, portanto, ao permitido na convenção de condomínio, a qual estão vinculados todos os condôminos”, disse a ministra Isabel Gallotti, ao seguir a divergência.

Isso ocorre porque as possibilidades de uso e fruição de imóveis em condomínio vertical são mais restritas. Atividades que podem ser livremente exercidas em casas ou em imóveis comerciais podem afetar o sossego e a segurança de condôminos e, por isso, estarão submetidas a dia e horário próprios estabelecidos na convenção.

“A aplicação do Direito exige bom senso e equilíbrio, levando em conta que acomodação legislativa sobre o tema ainda levará algum tempo. A solução nos parece ser a previsão da proibição de hospedagem pela natureza do condomínio, definida na convenção. O condomínio estritamente residencial não se amolda a esse tipo de hospedagem”, disse o ministro Raul, no voto-vista.

Para o relator, a controvérsia do caso não se soluciona a partir do conflito entre direito de propriedade e direito de vizinhança. O ponto principal é: não é possível a proibição absoluta da cessão do imóvel sob o argumento do desvirtuamento da finalidade residencial do prédio. A destinação econômica do apartamento não se confunde com atividade comercial.

Para além disso, o ministro Salomão apontou que essa economia de compartilhamento — da qual o Uber é um grande exemplo — é fruto de avanços disruptivos da sociedade moderna, e disse que são como água: será impossível tentar represá-la para evitar que alcance o ponto em que já se encontra, inclusive.

“O que estamos fazendo aqui é primeira leitura dos aspectos legais e jurídicos, mas serão — e ainda mais com a circunstância da pandemia — inevitáveis os avanços. É melhor que possamos regrá-los para que não fiquem ao sabor e conveniência de burla ou acertos que virão”, indicou.

“Não será uma decisão judicial que vai resolver questão de amplo impacto”, concordou a ministra Isabel Gallotti. “Será necessária intervenção do legislador para transformar esse tipo de contrato que é realidade em contrato típico, dando mais condições de segurança a quem se dedica a esse tipo de negócio que tem, a meu ver, intuito claro de lucro”.

Ao fechar a votação, o ministro Antonio Carlos Ferreira ainda contestou se o caso forma precedente sobre a matéria. “Esse processo talvez não seja bom para extrair abrangência maior porque existem diversas formas e modalidades de locação: pode ser só parte do imóvel, locação integral, locação por temporada. E é indiferente a forma da oferta. Cada edifício tem uma característica própria”, disse.

Em nota o Airbnb declarou que “os ministros destacaram que, no caso específico do julgamento, a conduta da proprietária do imóvel, que transformou sua casa em um hostel, não estimulada pela plataforma, descaracteriza a atividade da comunidade de anfitriões. Além disso, os ministros ressaltaram que a locação via Airbnb é legal e não configura atividade hoteleira, e afirmaram que esta decisão não determina a proibição da atividade em condomínios de maneira geral. Proibir ou restringir a locação por temporada viola o direito de propriedade de quem aluga seu imóvel regularmente.”

Considerações Finais

A locação por temporada é prevista em lei, seja por aplicativo ou não, e a proibição integral pode gerar uma demanda judicial ao condomínio.

Importante destacar o que a lei entende por locação por temporada. E para isto é preciso observar o art. 48 da Lei 8.245/91:

“Art. 48. Considera-se locação para temporada aquela destinada à residência temporária do locatário, para prática de lazer, realização de cursos, tratamento de saúde, feitura de obras em seu imóvel, e outros fatos que decorrem tão-somente de determinado tempo, e contratada por prazo não superior a noventa dias, esteja ou não mobiliado o imóvel.”

A locação por temporada é aquela de até 90 (noventa) dias e sem prazo mínimo. Portanto, em que pese o condomínio possuir áreas comuns, que devem se sujeitar a regras da coletividade de moradores, os apartamentos ou casas, áreas estas consideradas privativas, sujeitam-se ao direito de propriedade de cada proprietário, que pode locar a unidade na sua totalidade.

Em geral, o argumento referente à proibição da locação por temporada é a questão da segurança. Só que a proibição simples da locação por temporada nos condomínios, de forma geral, é vedada.

Por isso, é extremamente necessária a regulamentação desta prática nas convenções e regimentos internos dos condomínios, com regras claras e rígidas sobre a questão. Assim, o proprietário não teria seu direito de propriedade maculado e o condomínio poderia evitar futuros conflitos com os condôminos.

Importante observar, ainda, que a partir do momento que o condomínio estabelece tais regras, é preciso que o proprietário, ao anunciar seu imóvel em imobiliárias, sites e aplicativos de locação, deixe bem claro as regras aplicáveis no condomínio.

Com a recente decisão do STJ, passamos a ter um precedente para casos análogos (não é uma decisão em recurso repetitivo para todos os casos que tratam do mesmo assunto – locação – temporada – Airbnb, nem tem validade “erga omnes”).

Ou seja, vale como precedente para casos semelhantes, onde a unidade é utilizada de forma desvirtuada da destinação residencial, ou seja, alojamento/hospedagem com locação de cômodos/quartos a vários inquilinos e com oferta de serviços, sendo evidente não se tratar do contrato típico de locação de temporada previsto em lei federal. O direito não é uma ciência exata. E, inclusive, cabe citar que na própria Lei de Locação, existem diversas formas e modalidades de se operar o instituto, tendo sido operacionalizada por empresas e plataformas digitais e, nem por isso, se enquadram em ativ

Compensação em embargos à execução fiscal

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STJ consolida o entendimento de que não é possível discutir compensação feita na via administrativa em sede de Embargos à Execução Fiscal.

Recentemente a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça manteve o entendimento que vem sendo adotado no sentido de que os contribuintes não podem, na fase de execução fiscal, discutir compensação tributária não reconhecida pela Fazenda Nacional anteriormente na via administrativa, com o uso de crédito tributário para pagar débitos com o fisco.

Referida discussão em embargos à execução fiscal sempre foi medida tranquila realizada pelos contribuintes, haja vista que, com a não homologação das PERDCOMPs, não há possibilidade de contraditório na esfera administrativa.

A questão não é recente, sendo que o STJ já havia se posicionado de forma favorável aos contribuintes em sede de recurso repetitivo (Tema 294), oportunidade em que se firmou a tese “A compensação efetuada pelo contribuinte, antes do ajuizamento do feito executivo, pode figurar como fundamento de defesa dos embargos à execução fiscal, a fim de ilidir a presunção de liquidez e certeza da CDA, máxime quando, à época da compensação, restaram atendidos os requisitos da existência de crédito tributário compensável, da configuração do indébito tributário, e da existência de lei específica autorizativa da citada modalidade extintiva do crédito tributário”.

No entanto, o próprio STJ passou a ter uma interpretação mais restritiva daquele julgamento, principalmente a Segunda Turma, no sentido de que somente a compensação homologada é que seria passível de ser alegada em sede de Embargos à Execução.

Diante da divergência entre os entendimentos da Primeira e a Segunda Turma do STJ, o contribuinte opôs os Embargos de Divergência, para que o entendimento sobre a matéria fosse uniformizado.

Assim, restou consolidado pelo STJ que a divergência sobre o assunto entre a 1ª e a 2ª Turma já foi superada e que, portanto, de acordo com a Súmula 168 do STJ, não cabe discutir o assunto novamente. “Não cabem embargos de divergência, quando a jurisprudência do tribunal se firmou no mesmo sentido do acordão embargado”.

O relator do caso afirmou que, embora houvesse uma divergência sobre esse tema antes, as duas turmas alinharam o seu posicionamento, à luz do artigo 16, § 3º, da Lei de Execução Fiscal. Segundo esse dispositivo, nos embargos à execução fiscal, “não será admitida reconvenção, nem compensação, e as exceções, salvo as de suspeição, incompetência e impedimentos, serão arguidas como matéria preliminar e serão processadas e julgadas com os embargos”.

Em suma, a LEF prevê que o contribuinte deve promover a compensação em âmbito próprio (administrativo), e não em sede de embargos à execução fiscal. Mas isso não significa que, se houver indeferimento pelo Fisco, não possa ser arguida posteriormente.

Ressalta-se que a interpretação mais adequada desse dispositivo no atual cenário legal é de que são vedadas as compensações pretendidas pelos contribuintes em momento posterior ao início dos procedimentos de cobrança do débito.

Ou seja, a LEF visou proibir foi que o contribuinte alegasse em embargos à execução a existência de crédito passível de compensação, mas que ainda não tivesse sido realizada em momento anterior. Foi essa questão, inclusive, a analisada no repetitivo de 2009, quando os ministros entenderam pela possibilidade de se alegar compensações pretéritas como matéria de defesa, sem qualquer limitação aos casos que tenham sido homologados pela Fazenda

Desse modo, o STJ entende que a compensação tributária que pode ser alegada na fase de execução fiscal é aquela já reconhecida administrativa ou judicialmente antes do ajuizamento da ação de execução fiscal.

Ao manter o entendimento no sentido de vedar a alegação de compensação em embargos à execução fiscal, tornam-se definitivas as decisões administrativas que não homologam as compensações das empresas.

Cumpre ressaltar que as decisões da Fazenda, no sentido de negar o direito à compensação, são emitidas eletronicamente, mediante simples cruzamento operacional de dados e sem a análise concreta do crédito dos contribuintes.

Assim, em pouquíssimos meses, após o encerramento da discussão na esfera administrativa, há o ajuizamento e a citação da execução fiscal contra o contribuinte, o que, a partir da interpretação do STJ, impossibilitará a discussão da ilegitimidade da cobrança por embargos à execução fiscal.

De toda forma, isso não impede que os contribuintes questionem a recusa da Fazenda em aceitar o seu crédito tributário para pagar a dívida, no entanto, através de “via judicial própria”.

Referida decisão é muito ruim para os contribuintes, torna mais complexo e oneroso o contencioso tributário, obrigando o ajuizamento de ação ordinária correlata para discutir o assunto.

Com isso, a equipe do Veiga Law recomenda que os contribuintes avaliem os processos em andamento e, para os novos casos, optem por discutir os débitos tributários decorrentes da não homologação da compensação prévia por meio de ações anulatórias/ordinárias, e não mais na via dos Embargos à Execução, para evitar o risco de extinção da ação e manutenção da cobrança, sem que o judiciário sequer avalie o mérito da discussão.

A VACINAÇÃO E O RETORNO AO TRABALHO PRESENCIAL

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A vacinação e o retorno ao trabalho presencial é a pauta do artigo dessa semana no Veiga law.

O Plano Nacional de Vacinação do Ministério da Saúde garante a disponibilização gratuita de vacinas contra a Covid-19 em todo o país, mas, atualmente, menos da metade da população em idade laboral se encontra totalmente imunizada. Em alguns Estados, apenas parte desta população já seria elegível à vacinação.

Idealmente, a implementação de políticas internas sobre eventual obrigatoriedade da vacina e consequentes medidas disciplinares aos que a recusam deve considerar um cenário em que existem vacinas suficientes, disponíveis e gratuitas para todos os empregados.

Partindo dessa premissa, seria permitido ao empregador exigir a vacinação de seus empregados antes do retorno presencial? E mais, seria possível a aplicação de medidas disciplinares – e até mesmo demissão por justa causa – àqueles que recusam a vacina?

A discussão passa pelo conflito entre garantias constitucionais. De um lado, temos o direito à integridade física, à intimidade e à escusa de consciência dos empregados. De outro, as garantias fundamentais das empresas, como o direito à livre iniciativa e à propriedade, que lhes asseguram o direito de gerir o empreendimento como entender melhor e mais adequado. Somado a isso, e de fundamental importância para o tema, temos a obrigação legal dos empregadores de preservarem a higidez do meio ambiente de trabalho e o direito dos demais empregados à vida e à saúde.

A solução está na ponderação de direitos e em critérios de razoabilidade. O STF enfrentou o tema em dezembro de 2020 e fixou tese favorável à compulsoriedade da vacinação. Segundo a decisão, embora a vacinação não possa ser forçada, é permitido ao Estado impor medidas restritivas aos cidadãos que recusem a vacinação, como a aplicação de multas, restrição ao exercício de certas atividades ou à frequência de determinados lugares, dentre outras. Os Ministros invocaram o princípio constitucional da solidariedade, segundo o qual, os direitos da sociedade devem prevalecer sobre os direitos individuais.

Também o Ministério Público do Trabalho (MPT), através de estudo técnico realizado pelo Grupo de Trabalho Nacional GT-Covid-19, afirmou não ser a vacinação “apenas um direito individual, mas um direito-dever coletivo”, e que, salvo situações excepcionais e justificadas (como contraindicação médica), não há direito individual do trabalhador a se opor à vacinação, sendo possível ao empregador aplicar as medidas disciplinares previstas em lei.

No início do ano passado, o Ministério Público do Trabalho (MPT) já havia se posicionado, ocasião em que publicou um guia de vacinação, o qual ressalta que, neste momento, o direito coletivo à saúde se sobrepõe ao individual — escolher se vacinar ou não — e a empresa pode aplicar punições para manter a saúde dos outros funcionários.

O MPT já tem posicionamento institucional que é dever do empregador primeiro esclarecer sobre a importância da vacina. Uma vez que a vacina esteja disponível para todo mundo, o empregador tem o direito de exigir que, para entrar nas dependências da empresa, o trabalhador precisa estar vacinado. Ele tem o dever de proteger os outros empregados.

Neste momento, algumas companhias têm adotado seus protocolos exigindo a vacinação de quem já está no calendário. E seguindo as orientações do guia do MPT, o qual informa que “…a empresa não deve utilizar, de imediato, a pena máxima ou qualquer outra penalidade, sem antes informar ao trabalhador sobre os benefícios da vacina e a importância da vacinação coletiva, além de propiciar-lhe atendimento médico, com esclarecimentos sobre a eficácia e segurança do imunizante”.

Com base na proteção da coletividade e na preservação da saúde no ambiente de trabalho, é possível o empregador exigir de seus empregados a vacinação contra a Covid-19, especialmente nas atividades mais expostas a riscos, como trabalhadores da área de saúde, embarcados em navios e plataformas de petróleo, e em bares e restaurantes, desde que garantida a privacidade e confidencialidade dos dados individuais. É, ainda, facultado ao empregador, a aplicação de medidas disciplinares em caso de recusa injustificada à vacinação ou à comprovação desta, desde que precedidas de orientação.

Nesse sentido, deve o empregador, em caso de recusa injustificada do empregado, orientá-lo a respeito dos benefícios da vacinação, encaminhando-o ao posto de vacinação e concedendo um prazo para regularização. Persistindo a recusa sem justo motivo, poderá o empregador impedir o retorno ao trabalho presencial e aplicar advertências, suspensões e, até mesmo, a demissão sem justa causa do empregado. No que diz respeito à possibilidade de dispensa por justa causa, o tema não é pacífico, sendo recomendada a análise caso a caso, considerando as atividades desenvolvidas pelo empregado, a justificativa por ele apresentada e a gradação das penalidades.

APLICAÇÃO E NATUREZA DO DISPUTE BOARD

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Dispute Board pode ser definido como a criação de um comitê formado por profissionais imparciais e experientes para o acompanhamento da execução de um projeto e/ou contrato (principalmente em construção civil) que, por meio de sua instalação anterior ao conflito e previsão já no contrato inicial, busca desencorajar e evitar disputas desnecessárias e, quando inevitável, traga a solução ao conflito existente.

Historicamente, o Dispute Board tem sua primeira aparição relatada na década de 60 nos Estados Unidos na construção da Boundary Dam, localizada em Washington. Nesta ocasião, foi reunido um grupo de profissionais que, por meio de seu conhecimento técnico e imparcialidade, criou um comitê denominado de “joint Consulting board”, sendo convocado sempre que se constatava algum tipo de disputa ou conflito originados de aspectos técnicos da obra em execução. Dada sua eficácia e sucesso constatados nesta operação, criou-se, a partir daí, a figura do Dispute Board para auxiliar à resolução de conflitos em contratos de longa duração.

Com relação ainda à sua definição técnica e aplicação prática, o Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC) define que “a adoção desse método (Dispute Board) é especialmente aconselhável além do setor de construção civil, em relações oriundas de contratos de franquias, questões pertinentes à propriedade intelectual e casos de recuperação judicial de empresas. Isto porque tratam-se de acordos de longa duração, muitas vezes com grande quantidade de contratos conexos e derivados, o que justifica a aplicação do dispute board.”[1]

Com relação ao momento de sua instauração, o Dispute Board pode apresentar-se como Ad hoc ou permanentes. No primeiro caso, o mecanismo somente é utilizado para encontrar a solução de um ou mais conflitos pontuais, sendo certa sua dissolução após a resolução do conflito, enquanto o Dispute Board permanente é instalado na fase inicial da operação e perpetua-se até a finalização desta.

Outra característica relevante da distinção de espécies de Dispute Board diz respeito à força das decisões tomadas pelo comitê, que podem caracterizar-se por vinculantes ou não vinculantes. Desta forma, podemos considerar que o Dispute Board que emite recomendações e não possui poder vinculativo em suas decisões é classificado como recomendatório, ao passo em que o comitê que possui um poder decisório em seu laudo e vincula as partes ao seu cumprimento é classificado com adjudicatório, sendo certo que caso o comitê possua as duas características será considerado como híbrido.

O Dispute Board é criado, regido e instaurado por contrato, de modo que a mera existência de liberdade de contratação entre as partes permite sua criação. Deste modo, não há a necessidade de sancionar uma lei específica para deliberar sobre a instauração de comitês deste tipo. Tal pensamento também se aplica aos atos e operações que envolvem a Administração Pública, uma vez que o Dispute Board não exerce nenhuma função jurisdicional.

A instauração deste comitê pela simples autonomia da vontade das partes fez com que se iniciassem alguns questionamentos sobre a possibilidade de a Administração Pública fazer uso da instauração desta espécie de comitê. Tal dúvida tem origem no fato de que, nos contratos envolvendo a Administração Pública, a autonomia da vontade é substituída pela competência, de forma que, caso seja constatado que o agente público agiu fora de sua competência, o ato será considerado nulo.

Diante do questionamento acima mencionado, é estabelecido, doutrinariamente, que o Dispute Board é fundado em dispositivos contratuais, sendo certo que, se o agente público possui competência para a celebração de contratos, de forma equivalente, ele possui competência para dispor sobre a instauração do Dispute Board.

Ressalta-se ainda que a Administração Pública não está renunciando à nada ao instaurar a criação de um comitê desta espécie, sendo sua criação destinada à instrução de um método de solução de conflitos precedente à qualquer ato judicial que ofereça uma solução final e rápida aos eventuais conflitos que possam ocorrer durante a execução do contrato.

Apesar do entendimento favorável à utilização do Dispute Board em contratos envolvendo a Administração Pública, para dirimir esta questão e encerrar as dúvidas sobre o tema, o Município de São Paulo promulgou a Lei 16.873/2018 reconhecendo a aplicabilidade e legalidade do Comitê de Prevenção e Solução de Disputas (Dispute Board) aos contratos públicos, garantindo assim a fundamentação legal antes inexistente validando os modelos adotados anteriormente.

De maneira complementar ao já praticado anteriormente à promulgação desta Lei, o artigo 1º[2] determina que, quando aplicado o Dispute Board, este deverá estar previsto e regulado no edital e no contrato de celebração da operação.

Com relação à funcionalidade prática deste comitê, as partes devem definir previamente algumas normativas que irão direcionar a atuação do Dispute Board, tais como: a) Forma de nomeação dos membros e composição do comitê; b) Quais as disputas e conflitos que podem ser submetidos ao comitê; e c) regras procedimentais gerais e até recursos cabíveis às decisões proferidas. Todos os princípios estabelecidos para o comitê podem ser alterados e acordados de forma diversa pelas partes conforme se fizer necessário.

De forma conclusiva, podemos dizer que o Dispute Board é um comitê instaurado para a resolução rápida de conflitos e controvérsias em operações de contrato de longo prazo, caracterizando-se conforme seus princípios estabelecidos no contrato principal que o institui.


[1] https://ccbc.org.br/cam-ccbc-centro-arbitragem-mediacao/resolucao-de-disputas/dispute-boards/

[2] Art. 1º Os Comitês de Prevenção e Solução de Disputas para dirimir conflitos relativos a direitos patrimoniais disponíveis em contratos continuados da Administração Direta e Indireta do Município de São Paulo observarão as disposições desta lei e deverão, quando aplicáveis, estar previstos, respectivamente, no edital e contrato

OPEN BANKING: CONTEXTO HISTÓRIO E APLICAÇÃO NACIONAL

A evolução e o desenvolvimento de meios digitais de comunicação, redes sociais e formas de interação digitais trouxeram grandes mudanças à maneira pela qual os indivíduos passaram a se relacionar, sendo certo que a relação econômica com as instituições financeiras não seria diferente.

Em resposta a esta evolução, a economia global passou a adaptar-se para se tornar mais digital e colaborativa, ao passo em que deixou algumas burocracias e entraves que dificultavam a relação dos clientes com as Instituições financeiras. Prova disso é o surgimento de diversas fintechs que impuseram uma nova forma de condução de negócios promovendo uma experiência rápida e digital para seus clientes, destacando-se das instituições financeiras tradicionais por sua agilidade e eficácia.

Diante das inovações tecnológicas, culturais e sociais que vêm tomando espaço na sociedade, o Open Banking surge como um movimento que transforma o funcionamento tradicional das instituições financeiras para permitir a implementação de tecnologias seguras para o acesso de dados financeiros de cliente cujo objetivo é tornar o mercado mais competitivo com a criação de novos produtos e serviços mais eficientes.

De forma mais simples, o movimento do Open Banking pode ser definido pelo modelo colaborativo de compartilhamento de informações financeiras entre duas ou mais partes não afiliadas para fornecer recursos aprimorados para o mercado.[1]

Não obstante à segurança que deve ser observada no tratamento e na forma de circular dos dados financeiros de seus clientes, ao redor do mundo o Open Banking já possui algumas premissas bem fundamentadas que buscam equilibrar o desenvolvimento de novas tecnologias com o sistema normativo que regerá e regulará as novas tecnologias aplicadas ao movimento. Desta forma, podemos considerar como algumas premissas fundamentais do Open Banking as seguintes:

“Dados pessoais têm valor (principalmente na sociedade contemporânea);

A decisão sobre o que fazer com os dados é do titular deles, qual seja, o consumidor;

O sigilo dos dados referentes a operações financeiras deve ser estritamente mantido;

Deter dados sigilosos consiste em uma importante ferramenta para entender e traçar o perfil de consumidores; e

O setor financeiro sempre foi bastante restrito e regulado (resultando em uma concentração de poder na mão de poucos players).”[2]

Considerando o avanço do Open Banking ao redor do mundo em casos como na União Europeia (criação da prestação de serviços ASPSP “account servicing payment service providers”), Reino Unido (criação da instituição OBIE “Open Banking Implementation Entity”) e Hong Kong (publicação da “Open API Framework for the Hong Kong Banking Sector”), o Brasil não poderia deixar de iniciar sua preparação para a implementação deste movimento.

Como pontapé ao início desta regulamentação, o Banco Central publicou o Comunicado nº 33.455 em abril de 2019 estabelecendo as diretrizes e premissas que irão nortear a implementação do Open Banking no sistema financeiro nacional.

No entanto, analisando as implementações ocorridas nas localizações acima mencionadas e sua aplicação nacional, já é possível constatar que o grande problema à implementação do Open Banking será a falta de normativas expressas sobre o movimento e a carência de dispositivos regulatórios específicos, o que gera insegurança jurídica à sua implementação.

Um exemplo de tal insegurança é que a Lei de Sigilo Bancário Brasileira[3], em seu artigo 1º, parágrafo 3º, inciso I, dispõe que não constitui violação do dever de sigilo o compartilhamento e a troca de informações entre instituições financeiras quando realizada para fins cadastrais, não havendo nenhuma disposição sobre a troca de informações para outras finalidades, o que nos leva à conclusão de que as normas hoje vigentes no Brasil foram criadas sem prever ou considerar a existência do Open Banking, o que faz com que, em caráter excepcional, elas sejam aplicadas aos novos players do mercado financeiro, tendo como padrão a falta de regras normativas e regulamentações que dão segurança aos novos produtos e serviços que surgirão em função do movimento.

Diante dos comentários acima feitos, juntamente com o movimento do Open Banking, devem surgir novas discussões com relação à criação de normas e regulamentos que permitam o desempenho e a criação de produtos, serviços e tecnologias que serão utilizados e aplicados à realidade das instituições financeiras nacionais. Não obstante, deve surgir também a discussão sobre a criação de um Sandbox regulatório, que nada mais é do que um ambiente hermético e experimental onde é permitido às empresas inovadoras, dentro de limites pré-estabelecidos, operar temporariamente para validação de seus serviços e produtos que podem vir a ser oferecidos.

Seguindo o modelo de implementação aplicado em Hong Kong, o Brasil, por meio do Banco Central, irá implementar o Open Banking em fases, que serão abaixo classificadas conforme descrito em comunicado emitido pela entidade[4].

1ª Fase (01/02/2021): O Open Banking começa com as instituições participantes disponibilizando ao público informações padronizadas sobre os seus canais de atendimento e as características de produtos e serviços bancários tradicionais que oferecem. Nessa fase, não será compartilhado nenhum dado de cliente.

Com isso, podem surgir soluções que comparam diferentes ofertas de produtos e serviços financeiros, auxiliando as pessoas a escolherem a opção mais adequada ao seu perfil e necessidades. Entre as possíveis soluções que podem surgir estão os comparadores de tarifas bancárias, de tipos de contas e de cartões de crédito.”

2ª Fase (13/08/2021): A partir dessa fase, os clientes, se quiserem, poderão solicitar o compartilhamento entre instituições participantes de seus dados cadastrais, de informações sobre transações em suas contas, cartão de crédito e produtos de crédito contratados. É preciso reforçar que o compartilhamento ocorre apenas se a pessoa autorizar, sempre para finalidades determinadas e por um prazo específico. E será possível para o cliente cancelar essa autorização a qualquer momento em qualquer das instituições envolvidas no compartilhamento.

Como principal benefício, será possível aos clientes receber ofertas de produtos e serviços mais adequados ao seu perfil, a custos mais acessíveis e de forma mais ágil e segura. Também poderão surgir soluções mais personalizadas de gestão e de aconselhamento sobre finanças pessoais, por exemplo. O ecossistema financeiro como um todo também ganha com mais inovação, maior competitividade e com a racionalização de processos.”

3ª Fase (29/10/2021): Nessa fase, surge a possibilidade de compartilhamento dos serviços de iniciação de transações de pagamento e de encaminhamento de proposta de operação de crédito.

Isso abre caminho para o surgimento de novas soluções e ambientes para a realização de pagamentos e para a recepção de propostas de operações de crédito, possibilitando o acesso a serviços financeiros de forma mais fácil, célere e por meio de canais mais convenientes para o cliente, preservando a segurança do processo. Vale lembrar que também nesses casos o compartilhamento só acontece com a autorização prévia e específica do cliente.”

4ª Fase (15/12/2021): Dados sobre outros serviços financeiros passam a fazer parte do escopo do Open Banking. Os clientes – sempre que quiserem e autorizarem – poderão compartilhar suas informações de operações de câmbio, investimentos, seguros, previdência complementar aberta e contas-salário, bem como acessar informações sobre as características dos produtos e serviços com essa natureza disponíveis para contratação no mercado.

Assim, amplia-se ainda mais a possibilidade de surgimento de novas soluções para a oferta e a contração de produtos e serviços financeiros, mais integrados, personalizados e acessíveis, sempre com o consumidor no centro das decisões.”

Por fim, considerando a finalização da implantação do Open Banking no Brasil, podemos aduzir que as mudanças e novações normativas e regulatórias passarão a ser mais constantes e frequentes daqui em diante, sendo certo que o maior benefício do Open Banking  é a possibilidade de clientes de produtos e serviços financeiros permitirem o compartilhamento de suas informações entre diferentes instituições autorizadas pelo Banco Central e a movimentação de suas contas bancárias a partir de diferentes plataformas e não apenas pelo aplicativo ou site do banco, de forma segura, ágil e conveniente.


[1] BRODSKY Laura and OAKES Liz. McKinsey & Company. Data Sharing and Open Banking. McKinsey on Payments.

[2] PEDRO EROLES (COORD.) Fintechs, Bancos Digitais e Meios de Pagamento. Aspectos regulatórios das novas Tecnologias Financeiras. São Paulo. Quartier Latin, 2019. P.34.

[3] Lei Complementar nº 105 de 2001.

[4] https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/openbanking


A equipe do Veiga Law está disponível para solucionar suas dúvidas

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