A evolução e o desenvolvimento de meios digitais de comunicação, redes sociais e formas de interação digitais trouxeram grandes mudanças à maneira pela qual os indivíduos passaram a se relacionar, sendo certo que a relação econômica com as instituições financeiras não seria diferente.
Em resposta a esta evolução, a economia global passou a adaptar-se para se tornar mais digital e colaborativa, ao passo em que deixou algumas burocracias e entraves que dificultavam a relação dos clientes com as Instituições financeiras. Prova disso é o surgimento de diversas fintechs que impuseram uma nova forma de condução de negócios promovendo uma experiência rápida e digital para seus clientes, destacando-se das instituições financeiras tradicionais por sua agilidade e eficácia.
Diante das inovações tecnológicas, culturais e sociais que vêm tomando espaço na sociedade, o Open Banking surge como um movimento que transforma o funcionamento tradicional das instituições financeiras para permitir a implementação de tecnologias seguras para o acesso de dados financeiros de cliente cujo objetivo é tornar o mercado mais competitivo com a criação de novos produtos e serviços mais eficientes.
De forma mais simples, o movimento do Open Banking pode ser definido pelo modelo colaborativo de compartilhamento de informações financeiras entre duas ou mais partes não afiliadas para fornecer recursos aprimorados para o mercado.[1]
Não obstante à segurança que deve ser observada no tratamento e na forma de circular dos dados financeiros de seus clientes, ao redor do mundo o Open Banking já possui algumas premissas bem fundamentadas que buscam equilibrar o desenvolvimento de novas tecnologias com o sistema normativo que regerá e regulará as novas tecnologias aplicadas ao movimento. Desta forma, podemos considerar como algumas premissas fundamentais do Open Banking as seguintes:
“Dados pessoais têm valor (principalmente na sociedade contemporânea);
A decisão sobre o que fazer com os dados é do titular deles, qual seja, o consumidor;
O sigilo dos dados referentes a operações financeiras deve ser estritamente mantido;
Deter dados sigilosos consiste em uma importante ferramenta para entender e traçar o perfil de consumidores; e
O setor financeiro sempre foi bastante restrito e regulado (resultando em uma concentração de poder na mão de poucos players).”[2]
Considerando o avanço do Open Banking ao redor do mundo em casos como na União Europeia (criação da prestação de serviços ASPSP “account servicing payment service providers”), Reino Unido (criação da instituição OBIE “Open Banking Implementation Entity”) e Hong Kong (publicação da “Open API Framework for the Hong Kong Banking Sector”), o Brasil não poderia deixar de iniciar sua preparação para a implementação deste movimento.
Como pontapé ao início desta regulamentação, o Banco Central publicou o Comunicado nº 33.455 em abril de 2019 estabelecendo as diretrizes e premissas que irão nortear a implementação do Open Banking no sistema financeiro nacional.
No entanto, analisando as implementações ocorridas nas localizações acima mencionadas e sua aplicação nacional, já é possível constatar que o grande problema à implementação do Open Banking será a falta de normativas expressas sobre o movimento e a carência de dispositivos regulatórios específicos, o que gera insegurança jurídica à sua implementação.
Um exemplo de tal insegurança é que a Lei de Sigilo Bancário Brasileira[3], em seu artigo 1º, parágrafo 3º, inciso I, dispõe que não constitui violação do dever de sigilo o compartilhamento e a troca de informações entre instituições financeiras quando realizada para fins cadastrais, não havendo nenhuma disposição sobre a troca de informações para outras finalidades, o que nos leva à conclusão de que as normas hoje vigentes no Brasil foram criadas sem prever ou considerar a existência do Open Banking, o que faz com que, em caráter excepcional, elas sejam aplicadas aos novos players do mercado financeiro, tendo como padrão a falta de regras normativas e regulamentações que dão segurança aos novos produtos e serviços que surgirão em função do movimento.
Diante dos comentários acima feitos, juntamente com o movimento do Open Banking, devem surgir novas discussões com relação à criação de normas e regulamentos que permitam o desempenho e a criação de produtos, serviços e tecnologias que serão utilizados e aplicados à realidade das instituições financeiras nacionais. Não obstante, deve surgir também a discussão sobre a criação de um Sandbox regulatório, que nada mais é do que um ambiente hermético e experimental onde é permitido às empresas inovadoras, dentro de limites pré-estabelecidos, operar temporariamente para validação de seus serviços e produtos que podem vir a ser oferecidos.
Seguindo o modelo de implementação aplicado em Hong Kong, o Brasil, por meio do Banco Central, irá implementar o Open Banking em fases, que serão abaixo classificadas conforme descrito em comunicado emitido pela entidade[4].
“1ª Fase (01/02/2021): O Open Banking começa com as instituições participantes disponibilizando ao público informações padronizadas sobre os seus canais de atendimento e as características de produtos e serviços bancários tradicionais que oferecem. Nessa fase, não será compartilhado nenhum dado de cliente.
Com isso, podem surgir soluções que comparam diferentes ofertas de produtos e serviços financeiros, auxiliando as pessoas a escolherem a opção mais adequada ao seu perfil e necessidades. Entre as possíveis soluções que podem surgir estão os comparadores de tarifas bancárias, de tipos de contas e de cartões de crédito.”
“2ª Fase (13/08/2021): A partir dessa fase, os clientes, se quiserem, poderão solicitar o compartilhamento entre instituições participantes de seus dados cadastrais, de informações sobre transações em suas contas, cartão de crédito e produtos de crédito contratados. É preciso reforçar que o compartilhamento ocorre apenas se a pessoa autorizar, sempre para finalidades determinadas e por um prazo específico. E será possível para o cliente cancelar essa autorização a qualquer momento em qualquer das instituições envolvidas no compartilhamento.
Como principal benefício, será possível aos clientes receber ofertas de produtos e serviços mais adequados ao seu perfil, a custos mais acessíveis e de forma mais ágil e segura. Também poderão surgir soluções mais personalizadas de gestão e de aconselhamento sobre finanças pessoais, por exemplo. O ecossistema financeiro como um todo também ganha com mais inovação, maior competitividade e com a racionalização de processos.”
“3ª Fase (29/10/2021): Nessa fase, surge a possibilidade de compartilhamento dos serviços de iniciação de transações de pagamento e de encaminhamento de proposta de operação de crédito.
Isso abre caminho para o surgimento de novas soluções e ambientes para a realização de pagamentos e para a recepção de propostas de operações de crédito, possibilitando o acesso a serviços financeiros de forma mais fácil, célere e por meio de canais mais convenientes para o cliente, preservando a segurança do processo. Vale lembrar que também nesses casos o compartilhamento só acontece com a autorização prévia e específica do cliente.”
“4ª Fase (15/12/2021): Dados sobre outros serviços financeiros passam a fazer parte do escopo do Open Banking. Os clientes – sempre que quiserem e autorizarem – poderão compartilhar suas informações de operações de câmbio, investimentos, seguros, previdência complementar aberta e contas-salário, bem como acessar informações sobre as características dos produtos e serviços com essa natureza disponíveis para contratação no mercado.
Assim, amplia-se ainda mais a possibilidade de surgimento de novas soluções para a oferta e a contração de produtos e serviços financeiros, mais integrados, personalizados e acessíveis, sempre com o consumidor no centro das decisões.”
Por fim, considerando a finalização da implantação do Open Banking no Brasil, podemos aduzir que as mudanças e novações normativas e regulatórias passarão a ser mais constantes e frequentes daqui em diante, sendo certo que o maior benefício do Open Banking é a possibilidade de clientes de produtos e serviços financeiros permitirem o compartilhamento de suas informações entre diferentes instituições autorizadas pelo Banco Central e a movimentação de suas contas bancárias a partir de diferentes plataformas e não apenas pelo aplicativo ou site do banco, de forma segura, ágil e conveniente.
[1] BRODSKY Laura and OAKES Liz. McKinsey & Company. Data Sharing and Open Banking. McKinsey on Payments.
[2] PEDRO EROLES (COORD.) Fintechs, Bancos Digitais e Meios de Pagamento. Aspectos regulatórios das novas Tecnologias Financeiras. São Paulo. Quartier Latin, 2019. P.34.
[3] Lei Complementar nº 105 de 2001.
[4] https://www.bcb.gov.br/estabilidadefinanceira/openbanking
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