A Importância da Governança Corporativa na Identificação e Gerenciamento de Riscos

 

Todos os negócios e operações empresárias estão sujeitas a lidar com um ambiente rodeado de incertezas e riscos das mais diversas naturezas, sendo papel fundamental da direção e administração da empresa lidar com os riscos e administrá-los da maneira mais adequada possível, criando-se assim um sistema de gerenciamento de riscos efetivo.

 

Neste contexto, entende-se que o risco é a possibilidade de algo não dar certo, sendo encarado no ambiente corporativo por meio da quantificação e qualificação das incertezas, devendo ser gerenciados e analisados para subsidiar a tomada de decisão dos administradores e da direção da empresa.

 

Dada sua importância no cenário atual, o Instituto Brasileiro de Governança Corporativa (IBGC) publicou um manual para o gerenciamento de riscos e o categorizou como um sistema intrínseco ao planejamento estratégico de negócios, composto por processos contínuos e estruturados que sejam desenhados para identificar e responder a eventos que possam afetar os objetivos da organização e por uma estrutura de governança corporativa responsável por manter o sistema vivo e em funcionamento[1].

 

Não obstante, podemos constatar que a gestão adequada de riscos também faz parte das disposições aplicáveis aos programas de integridade corporativos segundo as diretrizes da Lei Anticorrupção[2], além de ser mencionada como critério objetivo no Formulário de Referência (FRE) de empresas de capital aberto (ICVM 480/09) e possuir uma obrigatoriedade de aplicação às Instituições Financeiras por meio da Resolução BACEN nº 4.745/2019.

 

Responsabilidades e Governança da gestão de risco

 

De forma genérica, podemos afirmar que o Conselho de Administração da Companhia é o principal responsável por traçar os objetivos estratégicos, o perfil e apetite ao risco da empresa e direcionar as ações corporativas segundo seu objetivo econômico, identidade corporativa e cultura da empresa.

 

Por definição e caracterização, a Lei das Sociedades por Ações (Lei nº 6.404/76) estabelece como competência do Conselho de Administração fixar a orientação geral dos negócios da Companhia, fiscalizar a gestão dos diretores e escolher e destituir os auditores independentes, tornando-se assim já evidente que, sob o aspecto legal, o Conselho de Administração é o principal responsável pelo gerenciamento de riscos e definição de estratégias da empresa.

 

Entretanto, esta responsabilidade não fica restrita ao Conselho de Administração, existindo algumas modalidades de gestão de risco que podem ser adotadas pelas empresas. Dentre as existentes, cabe destacar as metodologias ISSO 31000 e COSO (Committee of Sponsoring Organizations).

 

Podemos ressaltar ainda o modelo das três linhas de defesa que foi adaptado pelo IBGC da IIA (The Institute of internal Auditors) que prevê como uma primeira linha de defesa os controles da Administração, como segunda linha de defesa a criação de setores e áreas específicas para identificação de riscos (p. ex.: Controle Financeiro, Segurança, Qualidade, Inspeção, etc) e como terceira linha de defesa a criação de uma Auditoria interna para validação de procedimentos e medidas.

 

Classificação de riscos

 

Naturalmente, quando se tem por objetivo controlar ou gerenciar qualquer cenário, é necessário que seja realizada uma classificação quanto à origem ou medidas necessárias para contenção do problema.

 

Por ser algo intrínseco à atividade desempenhada pela empresa e sujeito às volatilidades e oscilações do mercado em que está inserida, os riscos são classificados e agrupados da forma mais adequada à realidade de cada empresa, mas podemos classificá-los incialmente em dois grandes grupos: Os riscos da estratégia e os riscos emergentes.

 

Os riscos da estratégia são aqueles originados pelas decisões administrativas da empresa, devendo ser identificados e previstos na elaboração do planejamento estratégico, tendo em vista as possíveis movimentações e reações do mercado e stakeholders. Por sua natureza preventiva e previsível, é possível se estabelecer um plano de ação para reduzir a probabilidade de ocorrência do evento de risco.

 

Como um exemplo desta espécie de risco podemos citar a gestão de talentos, a falta de liquidez, as reações de mercado, desenvolvimento da concorrência, desenvolvimento tecnológico/de mercado e as reações internas da empresa.

 

Os riscos emergentes, por sua vez, são externos às ações da empresa e dividem-se em duas espécies: Os riscos emergentes previsíveis e os não previsíveis.

 

Os previsíveis são aqueles originados no ambiente externo da empresa que, em certa maneira, não surgem de forma inesperada, ou seja, se bem estudados, podem ser antecipados e até utilizados em favor da empresa, como por exemplo ações de governo, inovações tecnológicas, comportamento de mercado e de consumidores e tendências sociais.

 

Os não previsíveis são aqueles que não podem ser previstos ou evitados em virtude de seus efeitos e magnitudes, atingindo não somente a atividade econômica da empresa em si, mas afetando todo o conjunto social na qual ela está inserida. Recentemente vivemos um exemplo de risco emergente não previsível com a pandemia do Covid-19, mas podemos citar como exemplo também a ocorrência de desastres naturais.

 

Não obstante, cabe realizar aqui uma distinção também sobre risco inerente e risco residual, sendo o primeiro caracterizado pelos riscos em que a empresa ainda pode tomar alguma ação para preveni-lo e o segundo como a exposição aos riscos após a tomada de todas as ações gerenciais possíveis.

 

Medidas práticas

 

Sob um olhar mais prático, recomenda-se a adoção de algumas medidas e procedimentos que os gestores e conselheiros das empresas podem tomar para tornar mais eficiente a identificação e a gestão dos riscos:

 

  • Elaboração e implementação de um planejamento estratégico que discorra sobre os riscos inerentes à atividade da empresa;

 

  • Criar comitês e procedimentos internos que, além de verificar constantemente a existência e a ameaça dos riscos já existentes, identifiquem não só o risco, mas também sua forma de tratamento ou amenização;

 

  • Estar atento aos movimentos de mercado e governamentais para estar sempre atento aos riscos externos da empresa;

 

  • Desenvolver um programa de governança corporativa descentralizada e independente que possua autonomia para apontar os riscos estruturais, administrativos e operacionais da empresa sem sofrer qualquer tipo de retaliação; e

 

  • Avaliar periodicamente os planejamentos elaborados, os comitês criados e a implementação e ação das medidas a serem adotadas.

 

Por fim, podemos constatar que a gestão de riscos corporativos vem deixando de ser um diferencial competitivo e vem tornando-se um requisito essencial para o desenvolvimento da atividade econômica pretendida, razão pela qual se faz extremamente necessário a análise de exposição de riscos e a adoção de medidas preventivas e corretivas que diminuam a exposição da empresa a estes riscos.

Nossa equipe de Direito Societário está à disposição para quaisquer esclarecimentos adicionais que sejam necessários.

Escrito por: Ricardo Ferle

[1] Gerenciamento de riscos corporativos: evolução em governança e estratégia / Instituto Brasileiro de Governança Corporativa. São Paulo, SP: IBGC, 2017, p.14

[2] Artigo 57, inciso V da Lei nº 12.846/13 (Decreto nº 11.129/22).

TRIBUNAIS ENTENDEM QUE NÃO DEVE SER COBRADO O IPTU EM IMÓVEIS SEM HABITE-SE

 

O TJ-SP, em julgamento de Mandado de Segurança, ratificou o entendimento de que o IPTU só deve ser exigido a partir do habite-se.

Esse entendimento foi adotado não só pela Corte Paulista, no Estado de Santa Catarina, o respectivo Tribunal de Justiça. em julgamento de recurso de apelação, entendeu que é impossível a cobrança de IPTU de imóvel que ainda não possui habite-se.

No caso apreciado, o imóvel ainda não havia tido o habite-se expedido devido a irregularidades em relação ao sistema de segurança contra incêndios, logo o Tribunal convalidou o entendimento de que, considerando que não há construção no local que sirva como habitação, uso e recreio, não é possível a incidência de IPTU.

Em termos práticos, a decisão corrobora entendimento que vem se consolidando, tendo em vista que o imposto não está condicionado tão somente à existência de área construída, mas sim a partir da propriedade e posse úteis.

Ressaltamos, ainda, que se pode questionar a base de cálculo do ITBI e do IPTU, quando o valor determinado pela fiscalização não condizer com a realidade de cada imóvel.

Nossa equipe tributária se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.

Escrito por Richard Buffalo

 

A REFORMA TRABALHISTA E O STF

 

As mudanças promovidas na CLT pela Reforma Trabalhista, Lei nº 13.467/2017, geraram inúmeras polêmicas e posições contrárias no mundo jurídico, fato que ocasionou diversos questionamentos junto ao Supremo Tribunal Federal, através de ADIs, ADPFs, dentre outros instrumentos constitucionais.

Passados cinco anos da Reforma, ainda há mais temas pendentes de julgamento do que julgados. Além disso, pode-se dizer que o STF tem se mantido “neutro” no que diz respeito às referidas alterações legais. Isso porque são analisados caso a caso e não é possível afirmar que a Corte é contra ou a favor da Reforma Trabalhista.

Até o momento, o STF manteve a não-obrigatoriedade da contribuição sindical, afastou a possibilidade do trabalho de gestante em local insalubre e, em um cenário inovador, determinou a adoção do IPCA Selic como índice de correção monetária aplicável aos débitos trabalhistas, afastando a incidência da Taxa Referencial.

Ademais, merece destaque a decisão através da qual o STF invalidou as regras da Reforma Trabalhista que determinavam o pagamento dos honorários periciais e advocatícios sucumbenciais por beneficiários da justiça gratuita, caso perdessem a ação, mas obtivessem créditos ​suficientes para o pagamento dessas custas. Neste sentido, defendia-se que as normas trazidas pela Reforma restringiam o acesso à justiça, o que é inconstitucional.

Mesmo assim, havia duas correntes. A primeira, apresentada pelo relator, ministro Luís Roberto Barroso, considerava que as regras seriam compatíveis com a Constituição e visavam apenas evitar a judicialização excessiva das relações de trabalho e a chamada “litigância frívola”. Essa corrente, integrada, também, pelos ministros Nunes Marques, Gilmar Mendes e Luiz Fux (presidente), defendeu a procedência parcial da ação para limitar a cobrança de honorários, mesmo quando pertinente a verbas remuneratórias, a até 30% do valor excedente ao teto do Regime Geral de Previdência Social.

No outro campo, o ministro Edson Fachin votou pela declaração de inconstitucionalidade de todas as normas impugnadas. Segundo ele, as regras introduzidas pela Reforma Trabalhista restringiam os direitos fundamentais de acesso à Justiça e o direito fundamental e da assistência judiciária gratuita. Esse entendimento foi seguido pelo ministro Ricardo Lewandowski e pela ministra Rosa Weber.

Outro julgamento que merece destaque é referente ao Tema 1046, em que concluiu o STF que o negociado prevalece sobre o legislado, entendimento que já havia sido trazido pela Reforma Trabalhista. Neste sentido, a Constituição Federal reconhece os acordos e convenções coletivas como direito fundamental do trabalhador, de modo que empregado e empregador podem pactuar aquilo que melhor se aplicar à relação de trabalho existente.

Entretanto, ainda existem muitos temas pendentes, como por exemplo no que tange à tarifação da indenização por danos morais, tendo em vista que o STF suspendeu o julgamento e, até o momento, não há um posicionamento concreto.

Desta forma, há uma insegurança jurídica ao redor de alguns temas introduzidos pela Lei nº 13.467/2017, motivo pelo qual recomenda-se cautela e o auxílio de advogados sempre que surgirem dúvidas a respeito.

Escrito por: Carolina Tavares

 

“QUIET QUITTING”, “QUIET FIRING” E AS POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES TRABALHISTAS

 

Um dos assuntos mais comentados nos últimos meses no âmbito das relações de trabalho é o chamado “quiet quitting”, conhecido como “desistência silenciosa”, que nada mais é do que o colaborador fazer o mínimo possível das obrigações exigidas no cargo, com o objetivo de estabelecer limites, proteger a própria saúde mental e, quem sabe, conseguir com que a empresa proceda com a extinção do contrato de trabalho por iniciativa própria.

Em contrapartida, também ganhou destaque o “quiet firing”, que seria uma atitude reativa por parte das empresas e seus respectivos gestores em relação ao “quiet quitting”. No caso do “quiet firing”, ocorre uma série de ações promovida pela liderança no ambiente de trabalho que visa ocasionar o pedido de demissão do empregado, como por exemplo, corte de promoções, ausência de “feedbacks”, mudanças repentinas nas demandas, dentre outras medidas que tornam a relação insustentável.

Essa nova moda pode se tornar mais um grande desafio para o setor de recursos humanos das organizações (https://veiga.law/2022/08/16/os-desafios-do-pos-pandemia-na-area-de-recursos-humanos/), já que tais práticas influenciam na cultura da empresa e podem ensejar discussões na Justiça do Trabalho.

Com relação ao “quiet quitting”, por mais que a ideia seja, a princípio, atrair a atenção do empregador para um possível descontentamento e, quem sabe, ser dispensado sem justa causa de modo que não haja renúncia ao valor de nenhuma verba, deve-se lembrar que a linha entre o que configura ou não uma dispensa por justa causa é bem tênue.

Isso porque a CLT, em seu art. 482, alínea “e”, traz como motivo para aplicação de justa causa a chamada desídia, que é o ato de realizar as atividades profissionais com desinteresse e de maneira relapsa, o que parece estar bastante relacionado às condutas incentivadas pelo “quiet quitting”. O mesmo dispositivo traz na alínea “h” a possibilidade de justa causa para ato de indisciplina ou de insubordinação, o que também pode ser encaixado na situação em debate.

Destaca-se, ainda, que o art. 456, parágrafo único, da CLT, dispõe que “(…) entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal”. Portanto, mais uma vez é imprescindível se atentar à questão da insubordinação, já que “fazer o mínimo” pode trazer consequências além daquelas que são esperadas.

Vale ressaltar que, por se tratar de uma medida extrema, a dispensa por justa causa deve sempre ser analisada de maneira individual, com foco nas peculiaridades do caso concreto e, se possível, com o auxílio de um advogado, já que a falta grave deve estar enquadrada nos requisitos da legislação trabalhista.

Contudo, de rigor salientar que a possível aplicação de uma justa causa para casos de “quiet quitting” não significa que a empresa não deva se atentar aos descontentamentos expostos e a situações que podem refletir na saúde mental de seus colaboradores (https://veiga.law/2022/09/28/setembro-amarelo-a-sindrome-de-burnout-e-o-papel-das-empresas-diante-dela) uma vez que o empregador tem o dever de zelar pelo bom ambiente laboral e acontecimentos ruins, nas mais diversas esferas, podem ensejar não só uma indenização, mas também a chamada rescisão indireta do contrato de trabalho, cuja previsão está no art. 483 da CLT.

E por falar em rescisão indireta, o “quiet firing”, por sua vez, também pode trazer consequências às empresas, uma vez que pode ocasionar a “falta grave do empregador”, pois, ao impor ao trabalhador o ócio forçado, sem designar atribuições a serem realizadas por dias ou mesmo meses, a empresa claramente extrapola os limites de seu poder diretivo de forma abusiva e em afronta à dignidade da pessoa humana do empregado, a qual tem no desempenho de sua capacidade produtiva o valor dignificante do trabalho.

Desta maneira, configurada a rescisão indireta do contrato de trabalho, o empregado tem direito a receber todas as verbas rescisórias, como teria em uma dispensa padrão sem justa causa. Além disso, nesse cenário, a Justiça do Trabalho costuma arbitrar indenização por danos morais nos mais diversos valores, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana – art. 5º da Constituição Federal – acima mencionado.

Diante do exposto, a forma mais efetiva de resolver conflitos, tanto do lado do empregado, como do lado do empregador, é insistir no diálogo, em “feedbacks” estruturados e na transparência das relações de trabalho, através da instituição de políticas éticas e francas entre todos os envolvidos.

[1] https://valor.globo.com/carreira/noticia/2022/09/23/quiet-firing-entenda-a-resposta-das-empresas-ao-quiet-quitting.ghtml

Escrito por: Carolina Tavares

 

 

 

 

 

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