Classificação de investidores não residentes (INRs) no brasil

Com o passar do tempo, tem se tornado cada vez mais comum e frequente notícias e informações envolvendo entidades sediadas no exterior que, por diversos meios e instrumentos, optam por realizar investimentos no Brasil nas mais diversas formas possíveis, envolvendo desde investimento direto em empresas de capital fechado até a negociação de ações no mercado de capitais nacional, o que dá origem à figura do Investidores Não Residentes (INRs).

 Os INRs podem ser definidos como as pessoas físicas ou jurídicas que, possuindo sede ou domicílio no exterior, realizam investimentos no Brasil. Tal definição inclui tanto os investimentos realizados no mercado nacional de capitais ou bolsa de valores, bem como os investimentos por eles realizados em empresas de capital fechado e as operações financeiras por eles efetivadas.

Já adentrando ao assunto referente à sua classificação, os INRs são popularmente classificados em “Investidor 4.373” ou “Investidor 4.131”. Esta classificação é oriunda das normativas que os regulam, uma vez que o 4.373 faz referência e é regulado pela Resolução nº 4.373 de 2014 do Banco Central do Brasil e o 4.131, por sua vez, refere-se à Lei 4.131/1962.

Iniciando pelo “Investidor 4.131”, com base no que diz o artigo 1º da Lei 4.131/1962[1], será considerado capital estrangeiro, para efeitos desta classificação, os bens – em sua classificação mais ampla – e recursos financeiros ou monetários que, desde que pertencentes à pessoas físicas ou jurídicas residentes no exterior, são introduzidos no Brasil para aplicação em atividade econômica.

Já o “Investidor 4.373”, por sua vez, com base no artigo 1º da Resolução 4.373/2014 do Banco Central do Brasil[2] se caracteriza quando os recursos aportados pela entidade estrangeira são destinados aos mercados financeiro e de capitais nacionais, em moeda estrangeira ou nacional, incluindo suas respectivas transferências de entrada e de saída do Brasil.

Assim, antes de adentrar às especificidades relevantes ao “Investidor 4.373”, já podemos distinguir as espécies de investidor olhando para a natureza de seus investimentos e sua forma de negociação. Dessa forma, no caso do investimento ser realizado e negociado dentro do ambiente de bolsa e mercado de capitais, o investimento será classificado como 4.373, de forma que, todos os demais tipos de investimento que não forem negociados em bolsa ou realizados dentro do ambiente de mercado de capitais do Brasil será um investimento via 4.131.

O “Investidor 4.373”, por se tratar de um investimento em mercado regulado, possui algumas características e distinções as quais merecem atenção. Os “Investidores 4.373” estão sujeitos à obtenção de registro na Comissão de Valores Mobiliários, que por sua vez irá vincular um Código Operacional CVM à entidade estrangeira, bem com suas operações estão sujeitas ao registro no Banco Central do Brasil no Sistema de Informações Banco Central (Sisbacen) por meio do Registro Declaratório Eletrônico (RDE).

Ainda, antes de iniciar suas operações no Brasil, o “Investidor 4.373” deverá seguir as orientações e requisitos constantes no artigo 2º do Anexo I à Resolução nº 4.373/14 do Banco Central do Brasil, que são:

Art. 2º Previamente ao início de suas operações, o investidor não residente deve:

I – constituir um ou mais representantes no País;

II – obter registro na Comissão de Valores Mobiliários; e

III – constituir um ou mais custodiantes autorizados pela Comissão de Valores Mobiliários

Ressalta-se que, por força normativa, o representante mencionado no inciso I acima mencionado, deverá ser uma instituição financeira ou uma instituição financeira autorizada pelo Banco Central do Brasil, não sendo, obrigatoriamente, representante da entidade para fins fiscais perante a Receita Federal do Brasil.

Ainda com relação ao representante, com base na Instrução CVM nº 560 de 2015[3], as responsabilidades dos representantes estão relacionadas à prestação de informações para o registro do INR na CVM, manter atualizadas as informações do INR perante os órgãos de registro e controle, apresentar à CMV, quando necessário, os contratos de representação e custódia celebrados pelo INR e comunicar, imediatamente, a CVM sobre a extinção ou modificação do contrato de representação firmado.

Com relação à obtenção de registro na Comissão de Valores Mobiliários (CVM), o INR deverá fornecer à entidade as informações constantes no Anexo I da Instrução CVM nº 560 de 2015 as quais envolvem diversas informações inerentes aos titulares, representantes e custodiantes do INR.

No tocante à figura do custodiante, segundo o descrito na Instrução CVM nº 542 de 2013[4], quando o serviço de custódia é prestado à investidores – residentes ou não – suas atividades são relacionadas à conservação, controle e conciliação das posições de calores mobiliários em contas de custódia em nome do investidor, também ao tratamento  das instruções de movimentação enviadas pelos representantes legitimados e ainda ao tratamento dos eventuais incidentes relacionados aos valores custodiados.

De forma a descrever, de forma breve, as atividades e atribuições dos custodiantes, trazemos abaixo o artigo 12 da Instrução CVM nº 542 de 2013:

Art. 12. O custodiante deve:

I – exercer suas atividades com boa-fé, diligência e lealdade em relação aos interesses dos investidores, sendo vedado privilegiar seus próprios interesses ou de pessoas a ele vinculadas;

II – tomar todas as medidas necessárias para a identificação da titularidade dos valores mobiliários, para a garantia de sua integridade e para a certeza sobre a origem das instruções recebidas;

III – zelar pela boa guarda e pela regular movimentação dos valores mobiliários mantidos em custódia, conforme as instruções recebidas, e pelo adequado processamento dos eventos a eles relativos, mediante a implementação de sistemas de execução e de controle eletrônico e documental;

IV – promover os atos necessários ao registro de gravames ou de direitos sobre valores mobiliários custodiados, tomando todas as medidas necessárias para a sua adequada formalização;

V – assegurar, de forma permanente, a qualidade de seus processos e sistemas informatizados, mensurando e mantendo registro dos acessos, erros, incidentes e interrupções em suas operações;

VI – garantir a segurança física de seus equipamentos e instalações, com o estabelecimento de normas de segurança de dados e informações que os protejam de acesso de pessoal não autorizado;

VII – dispor de recursos humanos suficientes e tecnicamente capazes de realizar os processos e operar os sistemas envolvidos na prestação dos serviços de custódia;

VIII – manter atualizados os manuais operacionais, a descrição geral dos sistemas a serem adotados na prestação dos serviços, o fluxograma de rotinas, a documentação de programas, os controles de qualidade e os regulamentos de segurança física e lógica; e

IX – implementar e manter atualizado plano de contingência que assegure a continuidade de negócios e a prestação dos serviços.

§ 1º O custodiante que presta serviços para investidores deve, além do disposto no caput:

I – realizar conciliação diária entre as posições mantidas nas contas de custódia e aquelas fornecidas pelo depositário central, assegurando que os valores mobiliários custodiados e os direitos provenientes destes valores mobiliários estejam registrados em nome do investidor junto ao depositário central, quando for o caso; e

II – manter sigilo quanto às características e quantidades dos valores mobiliários de titularidade dos investidores.

Por fim, nosso objetivo por meio do presente texto é deixar claro que o investimento será realizado via “4.373” quando for realizado dentro do ambiente dos mercados financeiro e de capitais nacionais, independentemente de sua forma de circulação. Ao passo em que, nas demais formas de investimento – seja via investimento direto ou operações financeiras em geral – o investimento deverá ser realizado via “4.131”. Não obstante, como acima demonstrado, por tratar-se de investimento em mercado regulado, os requisitos e procedimentos de constituição e manutenção de investimentos via “4.373” são mais complexos e detalhados, envolvendo inclusive contratos de custódia e representação.

Caso necessite de conteúdo adicional sobre o assunto ou ainda possua alguma dúvida, entre em contato conosco para mais informações. 

Referências:

[1] Art. 1º Consideram-se capitais estrangeiros, para os efeitos desta lei, os bens, máquinas e equipamentos, entrados no Brasil sem dispêndio inicial de divisas, destinados à produção de bens ou serviços, bem como os recursos financeiros ou monetários, introduzidos no país, para aplicação em atividades econômicas desde que, em ambas as hipóteses, pertençam a pessoas físicas ou jurídicas residentes, domiciliadas ou com sede no exterior.

2Art. 1º As aplicações de investidor não residente no Brasil nos mercados financeiro e de capitais no País e as respectivas transferências financeiras do e para o exterior, em moeda nacional ou em moeda estrangeira, devem obedecer ao disposto nesta Resolução, além das normas cambiais e da legislação específica.

3 Art. 12. É dever do representante:

I – prestar as informações necessárias para o registro do investidor não residente na CVM;

II – manter atualizadas as informações do investidor não residente previstas no Anexo 1;

III – apresentar à CVM, sempre que requisitado, os seguintes documentos:

a) contrato de constituição de representante; e

b) contrato de prestação de serviço de custódia de valores mobiliários celebrado entre o investidor não residente e pessoa jurídica autorizada pela CVM a prestar tal serviço;

IV – prestar à CVM as informações solicitadas em relação aos investidores não residentes por ele representados; e

V – comunicar imediatamente à SIN a extinção do contrato de representação

4 Art. 1º O serviço de custódia de valores mobiliários deve ser prestado por pessoas jurídicas autorizadas pela CVM nos termos da presente Instrução.

(…)

§ 2º A prestação de serviços de custódia de valores mobiliários compreende: I – no caso de prestação de serviços para investidores:

a) a conservação, o controle e a conciliação das posições de valores mobiliários em contas de custódia mantidas em nome do investidor;

b) o tratamento das instruções de movimentação recebidas dos investidores ou de pessoas legitimadas por contrato ou mandato; e

 c) o tratamento dos eventos incidentes sobre os valores mobiliários custodiados;


[1] Art. 1º Consideram-se capitais estrangeiros, para os efeitos desta lei, os bens, máquinas e equipamentos, entrados no Brasil sem dispêndio inicial de divisas, destinados à produção de bens ou serviços, bem como os recursos financeiros ou monetários, introduzidos no país, para aplicação em atividades econômicas desde que, em ambas as hipóteses, pertençam a pessoas físicas ou jurídicas residentes, domiciliadas ou com sede no exterior.

[2] Art. 1º As aplicações de investidor não residente no Brasil nos mercados financeiro e de capitais no País e as respectivas transferências financeiras do e para o exterior, em moeda nacional ou em moeda estrangeira, devem obedecer ao disposto nesta Resolução, além das normas cambiais e da legislação específica.

[3] Art. 12. É dever do representante:

I – prestar as informações necessárias para o registro do investidor não residente na CVM;

II – manter atualizadas as informações do investidor não residente previstas no Anexo 1;

III – apresentar à CVM, sempre que requisitado, os seguintes documentos:

a) contrato de constituição de representante; e

b) contrato de prestação de serviço de custódia de valores mobiliários celebrado entre o investidor não residente e pessoa jurídica autorizada pela CVM a prestar tal serviço;

IV – prestar à CVM as informações solicitadas em relação aos investidores não residentes por ele representados; e

V – comunicar imediatamente à SIN a extinção do contrato de representação.

[4] Art. 1º O serviço de custódia de valores mobiliários deve ser prestado por pessoas jurídicas autorizadas pela CVM nos termos da presente Instrução.

(…)

§ 2º A prestação de serviços de custódia de valores mobiliários compreende: I – no caso de prestação de serviços para investidores:

a) a conservação, o controle e a conciliação das posições de valores mobiliários em contas de custódia mantidas em nome do investidor;

b) o tratamento das instruções de movimentação recebidas dos investidores ou de pessoas legitimadas por contrato ou mandato; e

 c) o tratamento dos eventos incidentes sobre os valores mobiliários custodiados;

planejamento tributário sucessório à luz do entendimento da secretaria da fazenda e do stf

É muito comum que as famílias que possuam um patrimônio significativo, e seus respectivos herdeiros, se planejem ao longo da vida para a transmissão destes bens aos seus sucessores. Tal prática se tornou muito comum e é conhecida no meio jurídico como planejamento sucessório.

O planejamento sucessório é constituído, por sua vez, pela criação de uma estrutura de empresas as quais são criadas para receberem, costumeiramente, aportes por meio da integralização de imóveis. Cabe aqui mencionar que tal prática possui todo respaldo legal das normas vigentes, popularmente conhecida como elisão fiscal.

O principal objetivo na constituição desta estrutura seria conceder a maior eficiência fiscal possível de modo a onerar o contribuinte da forma menos gravosa, ou seja, com a menor incidência tributária possível.

E é tomando como base tais premissas que os órgãos fiscais Estaduais e Municipais direcionam os seus esforços para fiscalizar essas operações de modo a investigar as aludidas estruturas e verificar se de fato tais constituições possuem ou não finalidade/propósito negocial que justifique a sua criação ou se o principal objetivo do contribuinte foi a supressão do tributo com a omissão do fato gerador – simulação.

Deste modo, demonstrado o cenário acima, mostra-se necessária a análise dos entendimentos tanto dos Estados, com relação à incidência do ITCMD nestas operações, quanto dos Municípios com relação à incidência do ITBI, sendo este último previsto na Constituição Federal como uma garantia de imunidade ao contribuinte em determinadas situações.

Pronunciamento da Secretaria da Fazenda de São Paulo – SEFAZ-SP, por meio da resposta à consulta tributária 22070/2020, de 10 de agosto de 2020

Foi disponibilizado em 11.08.2020, no site da SEFAZ-SP, a Resposta à Solução de Consulta nº 22070/2020, por meio do qual tal resposta faz a análise da integralização de bens por valor de mercado ou pelo valor histórico, comumente constante na declaração de Imposto de Renda.

Logo de plano, restou consignado o entendimento fazendário de que a integralização de capital não está contemplada pela hipótese de incidência do ITCMD, imposto de competência estadual, contudo, na aludida resposta foram analisados alguns outros pontos os quais merecem reflexão como alerta a fim de evitar maiores transtornos com as autoridades fiscais fazendárias.

No item “8” da mencionada resposta à consulta tributária a Fazenda Estadual trouxe um exemplo no qual foi analisada a possibilidade da integralização do capital de uma sociedade pelo valor de mercado do imóvel ou pelo valor histórico do bem, sendo este último o escolhido, tendo como complemento do capital um terceiro no qual investiria R$ 100.000,00 em espécie.

A conclusão da resposta à consulta foi a de que este terceiro que ingressou como sócio, ao integralizar os R$ 100.000,00 em harmonia com o imóvel integralizado pelo valor histórico do bem, proporcionalmente ao valor das costas estabelecido, acabou por perceber um benefício econômico de R$ 50.000,00 e tal benesse se configuraria como uma doação, portanto havendo a incidência do ITCMD.

Nesse passo tal doação seria mitigada se os sócios acertassem uma contraprestação entre si na qual esse valor de R$ 50.000,00 fosse, de qualquer modo, pago aos demais sócios que compuseram a sociedade ora analisada.

A resposta à consulta tributária ainda contemplou a hipótese de o contribuinte validar este tipo de estrutura como forma de ocultar o fato gerador do ITCMD (hipótese de simulação). Nesse sentido um dos entraves encontrados pelo contribuinte é que os cartórios estão parando muitas operações para fiscalizar a mesma e verificar se existe algum tipo de simulação. Tal fato ocorre em razão da responsabilidade legal atribuída aos cartórios em caso de não recolhimento do imposto em comento. Frisa-se que a prerrogativa de fiscalização é dos órgãos fazendários e não dos cartórios de registro.

Nesse sentido, por mais conservador e temerário que seja, faz-se necessário observar os limites estabelecidos na Solução em comento, uma vez que estas servem de orientação aos contribuintes os quais pretendem realizar este tipo de operação.

Julgamento do RE 796.376 com repercussão geral

Outro fator importante a ser observado na elaboração de uma estrutura para planejamento sucessório é com relação à incidência ou não do ITBI, imposto de competência Municipal. O RE 796.376 julgou, sob a sistemática da repercussão geral, os efeitos e limites da imunidade prevista no artigo 156, §2º, I[1] da Constituição Federal.

No voto vencedor, o Ministro Alexandre de Moraes, analisou o inciso I, do §2º do artigo 156 da Constituição Federal e firmou o entendimento de que a imunidade prevista no inciso I do artigo em comenta alcança apenas o valor do montante a ser integralizado no capital social da empresa, sendo que o valor excedente será tributado, devidamente, pelo ITBI, confira-se o voto:

(…)Disso decorre, logicamente, que, sobre a diferença do valor dos bens imóveis que superar o valor do capital subscrito a ser integralizado, incidirá a tributação pelo ITBI, pois a imunidade está voltada ao valor ,destinado à integralização do capital social, que é feita quando os sócios, quitam as quotas subscritas.

Por outro lado, nada impede que os sócios ou os acionistas contribuam com quantia superior ao montante por eles subscrito, e que o contrato social preveja que essa parcela será classificada como reserva de capital. Essa convenção se insere na autonomia de vontade dos subscritores.

O que não se admite é que, a pretexto de criar-se uma reserva de capital, pretenda-se imunizar o valor dos imóveis excedente às quotas subscritas, ao arrepio da norma constitucional e em prejuízo ao Fisco municipal.

Ainda que o preceito constitucional em apreço tenha por finalidade incentivar a livre iniciativa, estimular o empreendedorismo, promover a capitalização e o desenvolvimento das empresas, não chega ao ponto de imunizar imóvel cuja destinação escapa da finalidade da norma.

No caso concreto, a diferença entre o valor do capital social e os imóveis incorporados é de R$ 778.724,00. É de indagar-se a razão pela qual uma empresa, cujo capital social é de R$ 24.000,00, pretende constituir uma reserva de capital em montante tão superior ao seu capital, e, sobretudo, livre do pagamento de imposto.

Assim, não cabe conferir interpretação extensiva à imunidade do ITBI, de modo a alcançar o excesso entre o valor do imóvel incorporado e o limite do capital social a ser integralizado.

Deste modo, com base no trecho supramencionado, retirado do voto vencedor, Ministro Alexandre de Moraes, o entendimento que se tem é o de que a imunidade do ITBI alcança apenas a parcela dos imóveis integralizados ao limite do capital social da empresa, e se, integralizado o montante superior, tais valores serão devidamente tributados a título de ITBI.

Em outras palavras, se no momento da indicação do imóvel a ser integralizado no capital social da empresa foi no montante de R$ 100.000,00, e no momento da efetiva integralização o mesmo imóvel é integralizado por valor superior ao indicado, sobre essa diferença, nos termos da decisão do Tribunal, haverá a incidência do ITBI.

Não obstante à tal entendimento, faz-se importante consignar que tal exigência só será possível mediante a edição de dispositivo normativo que regule tal prática, ou seja, há de se verificar em cada Município se existe ou não essa restrição legal.

Deste modo, considerando os posicionamentos das Fazendas Estaduais e Municipais, há de redobrar os cuidados na elaboração e constituição destas estruturas sucessórias de modo a evitar o risco de autuação fiscal em ambas as esferas, Estadual e Municipal, ao pagamento do ITCMD e ITBI, respectivamente.

Julgamento do RE 851.108

Outro ponto que merece grande destaque, está, atualmente, sendo discutido no Supremo Tribunal Federal, por meio do Recurso Extraordinário nº 851.108, de relatoria do Ministro Dias Toffoli, no qual analisa-se a regra contida no artigo 155, §1º, III da Constituição Federal, no qual discute-se a legalidade na tributação de doações oriundas no exterior.

Até o momento o contribuinte conta com o voto favorável do Ministro Relator, o qual propôs a adoção da seguinte tese: “É vedado aos Estados e ao Distrito Federal instituir o ITCMD nas hipóteses referidas no artigo 155, § 1º, III, da Constituição Federal sem a intervenção da lei complementar exigida pelo referido dispositivo constitucional”.

Até o presente momento o Ministro Edson Fachin proferiu voto acompanhando o entendimento do Ministro Relator. O julgamento atualmente encontra-se suspenso devido ao pedido de vistas solicitado pelo Ministro Alexandre de Moraes, sem data prevista para a retomada de seu julgamento. Deste modo maiores detalhes deste caso será abordado em um novo artigo, o qual também poderá trazer um impacto significativo aos planejamentos tributários.

Referências:

[1] ato ou efeito de elidir; supressão, eliminação – Oxford Languages

[2] Resposta à Solução de Consulta nº 22070/2020

[3] RE 796.376

[4] 851.108


[1] Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:

II – transmissão “inter vivos”, a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua aquisição;

§ 2º O imposto previsto no inciso II:

I – não incide sobre a transmissão de bens ou direitos incorporados ao patrimônio de pessoa jurídica em realização de capital, nem sobre a transmissão de bens ou direitos decorrente de fusão, incorporação, cisão ou extinção de pessoa jurídica, salvo se, nesses casos, a atividade preponderante do adquirente for a compra e venda desses bens ou direitos, locação de bens imóveis ou arrendamento mercantil.

escolas privadas e autonomia da vontade na expulsão dos alunos

Na sociedade atual, empresas, sociedades civis e instituições de ensino privado (âmbito educacional) possuem conjuntos de normas, regras e valores que devem ser seguidos por todos os seus funcionários e, em algumas vezes, por seus consumidores e utilizadores.

Estas regras visam nortear os procedimentos internos e tornar o ambiente mais equânime entre as partes, cuja falta de disposição e efetivação de tais regras podem gerar consequências e penalidades, criando verdadeira lei com aplicabilidade de suas disposições.

No ensino privado tal questão não é diferente, visto que as regras da instituição que devem ser seguidas por seus alunos e professores é denominado “Regimento Escolar”, cujo significado[1]:

O regimento escolar é um conjunto de regras que definem a organização administrativa, didática, pedagógica, disciplinar da instituição, estabelecendo normas que deverão ser seguidas para na sua elaboração, como, por exemplo, os direitos e deveres de todos que convivem no ambiente. Define os objetivos da escola, os níveis de ensino que oferece e como ela opera. Dividindo as responsabilidades e atribuições de cada pessoa, evitando assim, que o gestor concentre todas as ordens, todo o trabalho em suas mãos, determinando o que cada um deve fazer e como deve fazer.

Deste modo, o regimento escolar e suas diretrizes devem ser seguidas entre os funcionários, professores e os alunos que ali estejam alocados, visando a boa harmonia da instituição de ensino.

Os alunos, deste modo, possuem direitos e deveres na instituição que estejam matriculados, sendo como regra geral a todos os alunos as seguintes normas:

“(…):

Respeitar as autoridades da escola, os professores e os colegas;

Ser pontual e não chegar atrasado às aulas, caso contrário poderá receber uma advertência;

Utilizar o uniforme corretamente;

Cooperar para a conservação do patrimônio e dos móveis da escola;

Ser disciplinado e evitar bagunça ou desordem na entrada, saída e intervalos;

Permanecer na sala de aula até que seja liberado.[2]

Além destes princípios gerais, existem outros específicos atinentes a cada instituição de ensino, cuja variação pode alterar ante o cunho religioso ou da finalidade da instituição. Caso o aluno não siga devidamente as regras, poderá sofrer as sanções pela sua conduta.

Destaca-se que o Estado não detém o monopólio exclusivo do ensino, podendo a educação ser ofertada pela iniciativa privada, desde que atenda aos requisitos das normas gerais da educação, conforme descrito nos termos do art. 209 da Carta Magna de 1988:

Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes condições:

I – Cumprimento das normas gerais da educação nacional;

II – Autorização e avaliação de qualidade pelo Poder Público.

Diferente das escolas públicas, cujo processo de expulsão poderá tornar o aluno sem qualquer opção de ensino, as escolas privadas podem expulsar alunos que não seguem as regras e não estejam norteados com os princípios constitucionais da instituição, podendo rescindir o contrato caso existam motivos suficientes.

O processo de expulsão de qualquer aluno nas escolas privadas deve ser precedido de suas advertências e utilizada somente em última hipótese, visto ser a medida mais prejudicial ao aluno e a instituição, em especial com a rescisão contratual.

Em um julgado interessante, vejam que podem os colégios particulares expulsarem alunos que não coadunam com as normas e diretrizes internas da instituição:

APELAÇÃO CÍVEL. ENSINO PARTICULAR. AÇÃO DE REPARAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS INOCORRENTES. 1. Histórico procedimental do autor que aponta diversas ocorrências, tendo seus genitores sido chamados a comparecer na escola em várias oportunidades, ocasião em que firmaram termo de compromisso como condição para a realização das rematrículas para os anos de 2010 e de 2011. 2. Conduta grave e inadequada nas dependências da escola, a justificar a decisão exarada pela demandada, por meio de seu Conselho Pedagógico, no sentido de solicitar que o autor procurasse outra escola para dar continuidade aos seus estudos. 3. Ausente ato ilícito por parte da demandada, não há falar em direito às reparações por danos materiais e morais. Sentença mantida. RECURSO DESPROVIDO. (Apelação Cível Nº 70053919734, Quinta Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Julgado em 26/06/2013)

(TJ-RS – AC: 70053919734 RS, Relator: Isabel Dias Almeida, Data de Julgamento: 26/06/2013, Quinta Câmara Cível, Data de Publicação: Diário da Justiça do dia 01/07/2013)

Outro ponto que é crível dizer é que com a expulsão, o aluno não estará desamparado, pois poderá manter-se matriculado em instituição pública ou outra privada para retomar seus estudos.

Trata-se de agravo de instrumento interposto em face de decisão que indeferiu liminarmente a tutela pretendida pelo autor para a concessão de licença para suspender os efeitos do ato administrativo que o desligou do Colégio Militar de Curitiba-PR. (…) 2.Esta magistrada não verifica presente, no caso, a verossimilhança nas alegações do Autor. Em primeiro lugar, observe-se que a própria petição inicial reconhece haver previsão, no regimento interno do CMC, sobre constituir falta gravíssima, passível de desligamento do colégio, a conduta do aluno que “portar, tentar utilizar, usar, executar e/ou valer-se de meios ilícitos ou fraudulentos para a realização de qualquer tipo de avaliação da aprendizagem ou resolução de trabalhos escolares. “Desta forma, em tese não há ilegitimidade nem ilegalidade na pena de desligamento/expulsão aplicada ao Autor. Quanto à analogia de a referida penalidade equivaler à pena perpétua, trata-se de argumento inconsistente, diante das centenas de escolas e colégios não militares, públicos e particulares, à disposição da família do aluno para continuidade obrigatória de seus estudos, e que não poderão lhe negar matrícula, a teor do artigo 208, I, da Constituição. Em terceiro lugar, a existência da sindicância para apuração da falta atribuída ao aluno demonstra, a princípio, o respeito da Instituição de Ensino aos princípios do contraditório e da ampla defesa. (…). Intimem-se, sendo que a parte agravada na forma e para os fins do inciso II do artigo 1.019 do NCPC. Após, voltem conclusos.

(TRF-4 – AG: 50520628420174040000 5052062-84.2017.4.04.0000, Relator: MARGA INGE BARTH TESSLER, Data de Julgamento: 25/09/2017, TERCEIRA TURMA)

A todos é dado o arbítrio de fazer o que quiser é ser livre para decidir o próprio destino, podendo até mesmo desfazer relações outrora realizadas, o que se aplica ao presente caso, em especial quando uma das partes não tem qualquer interesse manter a relação.

Veja que o direito à educação é consagrado em seu art. 205 da Constituição Federal, devendo a priori ser dever do estado e da Família: 

Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho.

Para a efetivação deste direito no Estado Brasileiro, é assegurado que a educação é um dever do estado incentivada pela sociedade, visando assim o aperfeiçoamento dos infantos e propagação de conhecimento a todos as camadas sociais, motivo que não pode manter a instituição de ensino a continuidade de seu serviço por aluno displicente e que não coaduna com o seu regimento interno, mesmo após ter tentando outras soluções para adequar a má-conduta. 

O ensino público, visto já ser ofertado de forma gratuita à população, não está no entrave das relações contratuais e a questões atinentes ao regimento interno das instituições privadas.

Portanto, o regimento interno é adesivo ao contrato, motivo que todas as partes (processos, alunos, representantes dos alunos e funcionários) devem se guiar com base neste instrumento.

Os tribunais têm entendido pela Autonomia da Vontade, considerando que ninguém deve manter-se contratado quando inexiste interesse comercial, interesse de imagem ou qualquer outro fator que possa afetar as atividades de um dos contratantes, tendo o direito de rescindir quando assim o desejar, sendo neste caso a última hipótese.

Considerando o direito constitucional à liberdade, o qual também abrange direito em não se manter contratada, é crível também a aplicação do artigo 188 do Código Civil que tutela a legalidade do ato:

Art. 188. Não constituem atos ilícitos:

I – Os praticados em legítima defesa ou no exercício regular de um direito reconhecido;

Se analisarmos o conceito de boa-fé objetiva, é inegável que as partes devem agir de maneira correta, evitando lesões e condutas que possam afetar de sobremaneira as obrigações.

Neste sentido, a obrigatoriedade de manter a instituição veiculada a um aluno não querido, por violação ao seu regimento interno, não deve ser aceita e muito menos imposta pelo Estado ou Judicialmente, sob violação à Autonomia da Vontade e quebra da harmonia institucional. 

Responsáveis pelo artigo:
Luís Eduardo Veiga
Cristiano Medeiros de Castro

Referências:

Santos expulsa sócio do clube após caso de racismo

TRT-2 chancela demissão por justa causa por declarações discriminatórias


[1] Disponível em: Regimento Escolar

[2] Disponível em: Quais são os direitos e deveres dos estudantes?

impactos da lei geral de proteção de dados nas relações de trabalho

A LGPD foi criada para prever e regulamentar questões relacionadas ao tratamento de dados pessoais nos meios digitais, inclusive por pessoas físicas ou jurídicas, privadas ou públicas. A sua aplicação se dá em todos os setores da economia e do Direito, sendo aplicável sempre que houver algum tipo de coleta de dados de terceiros, como ocorre, por exemplo, nas relações trabalhistas e consumeristas.

A LGPD surge com a finalidade de proteger as liberdades e direitos fundamentais, trazer segurança jurídica aos atores envolvidos no mundo da coleta, armazenamento e uso de dados (digitais ou não), e para estabelecer regras de proteção de dados e critérios no tratamento desses dados pessoais.

Fundamentos da LGPD

I — O respeito à privacidade;

II — A autodeterminação informativa; (que nada mais é do que a ideia de que o indivíduo titular de dados pessoais deve ter controle, ou ao menos plena transparência, sobre a destinação dada às suas informações pessoais, bem como das metodologias utilizadas para tanto.)

III — A liberdade de expressão, de informação, de comunicação e de opinião;

IV -— A inviolabilidade da intimidade, da honra e da imagem;

V — O desenvolvimento econômico e tecnológico e a inovação;

VI — A livre iniciativa, a livre concorrência e a defesa do consumidor;

VII — Os direitos humanos, o livre desenvolvimento da personalidade, a dignidade e o exercício da cidadania pelas pessoas naturais.

Princípios da LGPD

O artigo 6º da lei aduz que, além da boa-fé, são princípios da LGPD:

I — Finalidade: realização do tratamento para propósitos legítimos, específicos, explícitos e informados ao titular, sem possibilidade de tratamento posterior de forma incompatível com essas finalidades;

II — Adequação: compatibilidade do tratamento com as finalidades informadas ao titular, de acordo com o contexto do tratamento;

III — Necessidade: limitação do tratamento ao mínimo necessário para a realização de suas finalidades, com abrangência dos dados pertinentes, proporcionais e não excessivos em relação às finalidades do tratamento de dados;

IV — Livre acesso: garantia, aos titulares, de consulta facilitada e gratuita sobre a forma e a duração do tratamento, bem como sobre a integralidade de seus dados pessoais;

V — Qualidade de dados: garantia, aos titulares, de exatidão, clareza, relevância e atualização dos dados, de acordo com a necessidade e para o cumprimento da finalidade de seu tratamento;

VI — Transparência: garantia, aos titulares, de informações claras, precisas e facilmente acessíveis sobre a realização do tratamento e os respectivos agentes de tratamento, observados os segredos comercial e industrial;

VII — Segurança: utilização de medidas técnicas e administrativas aptas a proteger os dados pessoais de acessos não autorizados e de situações acidentais ou ilícitas de destruição, perda, alteração, comunicação ou difusão;

VIII — Prevenção: adoção de medidas para prevenir a ocorrência de danos em virtude do tratamento de dados pessoais;

IX — Não discriminação: impossibilidade de realização do tratamento para fins discriminatórios ilícitos ou abusivos;

X — Responsabilização e prestação de contas: demonstração, pelo agente, da adoção de medidas eficazes e capazes de comprovar a observância e o cumprimento das normas de proteção de dados pessoais e, inclusive, da eficácia dessas medidas.

A quem se aplica a LGPD?

A LGPD se aplica a toda pessoa natural ou jurídica, de direito público ou privado, visando garantir a proteção dos direitos fundamentais de privacidade, liberdade e livre desenvolvimento da personalidade da pessoa natural, e necessariamente precisa ser observada pela União, Estados, Distrito Federal e municípios, em relação às normas gerais.

A LGPDnão se aplica ao tratamento de dados pessoais realizado por pessoa natural para fins exclusivamente particulares e não econômicos; realizado para fins — exclusivamente — jornalísticos, artísticos ou acadêmicos.

A LGPD ainda não se aplica para fins exclusivos de: Segurança Pública; Defesa Nacional e segurança do Estado ou atividades de investigação e repressão de infrações penais; ou provenientes de fora do território nacional e que não sejam objeto de comunicação, uso compartilhado de dados com agentes de tratamento brasileiros ou transferência internacional de dados com outro país que não o de proveniência, desde que o país de proveniência proporcione grau de proteção de dados pessoais adequado ao previsto.

LGPD nas relações de trabalho

Ao contrário do que acontece no Regulamento Geral sobre a Proteção de Dados (GDPR, na silha em inglês), a Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) não traz de modo específico qualquer previsão quanto às relações de trabalho.

Já o regulamento europeu possui disposições específicas sobre o tratamento de dados nas relações entre o empregado e o empregador.

Por isso a aplicação da LGPD nas relações de trabalho demanda uma análise conjunta do que trata a legislação trabalhista e os elementos acrescidos pela LGPD relacionados à proteção de dados.

FASE PRÉ-CONTRATUAL

Existem alguns pontos que demandam atenção. A LGPD nas relações trabalhistas se aplica desde a fase pré-contratual, em que há o recebimento dos currículos dos candidatos a uma determinada guarda.

A fase pré-contratual é a fase do primeiro contato do empregado com o empregador e geralmente é realizada por terceiros (recrutador, departamento pessoal, empresas especializadas etc.).

Nessa fase há a disponibilização da vaga, análise do currículo, entrevistas, dinâmicas e posterior escolha do candidato selecionado.

Nessa fase é proibida a coleta de dados que possam gerar qualquer critério discriminatório entre os candidatos, como, por exemplo, solicitação de exames de gravidez, toxicológico, exames de sangue, atestado de antecedentes criminais e análise de crédito (débito).

Essa é a regra. Contudo, há exceções previstas em lei, como é o caso do exame toxicológico para o motorista profissional (artigo 168, § 6°, da CLT) e do atestado de antecedentes criminais que é obrigatório para quem trabalha como vigilante (artigos 12 e 16, VI, da Lei n. 7.102/1983 c/c art. 4°, I da Lei n. 10.826/2003).

Por outro lado, o exame de gravidez e a análise de crédito (débito) — mesmo para trabalho em instituições financeiras — são proibidos (artigo 1° da Lei n. 9.029/1995), sendo o segundo, inclusive, com base nos termos do Acórdão do TST prolatado nos autos do Processo n. 1109-68.2012.5.10.0020.

A empresa precisará informar claramente aos candidatos não selecionados a política de utilização dos dados que foram fornecidos e, principalmente, o que será feito com os dados e documentos daqueles que não foram selecionados.

A própria LGPD tem como princípio a não discriminação, o que reforça os entendimentos já solicitados no âmbito trabalhista, que proíbem a discriminação de candidatos devendo a recusa acontecer em decorrência de eventual incompatibilidade técnica para a função a ser desempenhada.

É interessante que a autorização para armazenamento dos dados exista, bem como a autorização para compartilhamento dos dados com a finalidade específica informada. Um bom exemplo é o compartilhamento desses dados entre agências de emprego, por outro lado, não poderia haver o compartilhamento das informações para uma agência de publicidade que busca contato com potenciais consumidores, já que, em uma situação como essa haveria o desvio de finalidade.

FASE CONTRATUAL

Nesta fase o empregado terá conhecimento da política de tratamento de dados da empresa e dará o seu consentimento (ou não) expresso quanto ao seu teor.

Na fase contratual o próprio contrato de trabalho passar a ser um documento composto por dados pessoais, o que amplia a responsabilidade quanto à guarda dessas informações por parte do empregador.

Os contratos devem conter cláusulas específicas relacionadas ao consentimento para o uso dos dados das informações dos colaboradores, quando o uso não estiver baseado no cumprimento de alguma obrigação legal.

Em outro ponto se fazem necessárias também, cláusulas que expressem a responsabilidade do colaborador quanto a guarda das informações que ele possa ter acesso em decorrência da atividade desempenhada dentro da instituição.

Sendo a LGPD uma legislação nova e que requer um forte trabalho educacional para que se torne efetiva, os colaboradores precisam ser treinados e capacitados para que possam saber quais são as suas responsabilidades diante das previsões trazidas pela lei e das normativas internas das empresas.

Como visto, o consentimento do funcionário deve ser expresso e as cláusulas que versarem sobre a política de tratamento de dados da empresa devem vir destacadas no documento, de forma a garantir a observância dos princípios da finalidade, transparência e segurança.

Há casos específicos em que a LGPD se aplicará na fase contratual, vejamos:

  • Ficha de registro: na ficha de registro é comum que contenha dados pessoais e dados sensíveis, a exemplo da filiação a sindicato. Nesse aspecto a LGPD prevê expressamente a necessidade de tratamento desses dados com a limitação de acesso à ficha de registro do funcionário.
  • Formalização de contratos e aditivos: destacam-se os contratos e aditivos, principalmente para quem já possuía o vínculo de emprego antes da entrada em vigor da LGPD. Para esses casos, será necessária a adequação do contrato de trabalho à LGPD.
  • Realização de exames: a realização de exames periódicos encontra respaldo na legislação vigente. Assim, todos os funcionários celetistas são obrigados a realizar o exame médico periódico. Tais exames abrangem a avaliação clínica e envolvem anamnese ocupacional e exames físico e mental, sendo possível haver exames complementares de acordo com os termos específicos da NR-7. Contudo, não podem ser solicitados exames que possam expor a saúde do trabalhador a fim de causar-lhe discriminação, a exemplo dos exames de HIV, gravidez, câncer etc.
  • Recebimento de atestados: embora não seja obrigatório o preenchimento da CID (Classificação Internacional de Doenças e Problemas Relacionados à Saúde) no atestado médico, caso haja identificação da doença e/ou o motivo do afastamento, pela LGPD, tais dados passam a ser dados sensíveis e, portanto, precisarão de política específica de guarda e acesso.
  • Compartilhamento de dados com seguradoras, planos de saúde, entidades sindicais: pela LGPD o compartilhamento desses dados precisará de autorização expressa do titular, principalmente quando se tratar de dados de familiares e de terceiros. A exceção virá quando essas informações decorrerem de pedido judicial, de texto de lei ou para fins de dados de estatística do governo.


Algumas questões práticas do ambiente de trabalho:

  • Dados biométricos: a LGPD classifica os dados biométricos como dados pessoais sensíveis. Os dados biométricos e genéticos são tratados pela LGPD como dados pessoais sensíveis pois podem ser utilizados para classificar grupos de indivíduos ou reconhecê-los individualmente. O reconhecimento biométrico facial é capaz de permitir a classificação do indivíduo em gênero ou etnia.
  • Menor aprendiz: a formalização da contratação do menor aprendiz passará por mudança significativa. Isso acontecerá porque o §1º do artigo 14 diz que o “tratamento de dados pessoais de crianças deverá ser realizado com o consentimento específico, em que destaque, dado por pelo menos um dos pais ou responsável legal“. Essa mudança se dá, pois, a lei só previa a assistência do menor no momento da rescisão e, com a LGPD, a assistência deverá ser outorgada também na contratação.
  • Vigilância de empregados (e-mails, redes sociais, dispositivos funcionais, dispositivos pessoais, geolocalização): a LGPD não proíbe o acesso a e-mails ou dispositivos funcionais. Contudo, a informação deverá ser clara, dispondo do propósito e finalidade da coleta, assim como deverá ter a ciência do funcionário quanto aos limites do acesso da empresa aos seus dados pessoais e o tratamento que será dado a esses dados.
  • Monitoramento interno e externo do ambiente da empresa: a LGPD não proíbe o monitoramento interno e externo do funcionário, mas tal monitoramento deverá ser justificado e com o consentimento do funcionário, zelando pela transparência, finalidade e necessidade.
  • Compartilhamento de dados pessoais de empregados entre grupo econômico e terceiros: caso o controlador precise comunicar ou compartilhar dados pessoais com terceiros, deve obter consentimento expresso do titular para esse fim, exceto em situações já previstas em lei que dispensam tal autorização. Tal previsão legal está no §5º do artigo 7º da LGPD e revela a necessidade de que as empresas sejam mais cautelosas ao compartilhar e receber dados de clientes como decorrência de serviços prestados a outras empresas, uma vez que sempre deverá haver uma expressa e específica autorização do titular dos dados para que haja o compartilhamento dessas informações.
  • Teletrabalho e proteção de dados: sem dúvidas a finalidade precípua da LGPD é a proteção de dados do titular face àqueles que coletam esses dados. Quando tratamos de “teletrabalho”, o principal elemento para traçar as diretrizes da atuação da empresa no ambiente de trabalho do seu funcionário (residencial ou não) se dará pelo contrato de trabalho e as previsões acerca da aquisição, manutenção e fornecimento de equipamentos tecnológicos e da infraestrutura necessária para a prestação do trabalho. Tais medidas equiparam-se ao caso do uso de computador ou e-mail institucional no qual é permitido o acesso pelo empregador com o conhecimento do funcionário. Já em caso de uso de equipamentos pessoais, tal acesso não atende à finalidade da LGDP, em atenção aos princípios nela previstos, além do próprio artigo 5º da CF/88, que garante a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade.


RESPONSABILIZAÇÃO DO EMPREGADO

O treinamento é extremamente necessário já que nos casos de incidentes de segurança com os dados, a depender da situação, será necessária a apuração da conduta do colaborador para compreender se houve culpa ou dolo.

Sem a devida capacitação torna-se inviável a responsabilização do colaborador diante de uma conduta realizada e que possa ter ocasionado o vazamento ou a utilização inadequada de dados.

As falhas ocorridas podem gerar consequências contratuais para a empresa, como as multas previstas e até mesmo danos à reputação da marca. Por isso, também será necessário identificar nas operações de tratamento de dados que serão realizados quem são os operadores e controladores, justamente para que a responsabilização possa ser realizada de modo adequado.

FASE PÓS-CONTRATUAL

Quando da ocorrência de eventual desligamento do funcionário da empresa, seja por qual motivo for, também é necessária a observância dos preceitos da LGPD.

Isso se dá pelo fato de que a LGPD, expressamente, aduz que é necessária a informação de finalização do uso de dados, seja por determinação legal, seja por solicitação do titular do direito.

Ocorre que, quando falamos de relações trabalhistas, há obrigações de guarda de documentos que decorrem de imposição legal, e isso afasta a solicitação particular do titular do direito.

São situações que precisarão de análise caso a caso, como, por exemplo, o dever de guarda para fins de documentação probatória para ações trabalhistas. Como sabido, o prazo decadencial para propositura de ação trabalhista é de dois anos contados da data do desligamento (considerando a projeção do aviso prévio). Portanto, a empresa possui garantia legal para guardar documentos comprobatórios dentro do prazo prescricional do direito de ação do titular do direito.

No caso das relações com os empregados, existem vários documentos que precisam ser armazenados diante das obrigações legais delimitadas por diversos órgãos públicos e, há ainda, a necessidade de guarda para comprovação das informações relacionadas ao período em que o colaborador esteve vinculado a empresa.

É preciso então observar os prazos prescricionais de cada obrigação para elaboração da política de eliminação de dados que deve abarcar os dados dos colaboradores, sem que isso possa representar prejuízo posterior para instituição.

CONTRATAÇÃO: PRESTADOR DE SERVIÇOS X CLT

Com as delimitações trazidas pela LGPD quanto às responsabilidades do Controlador, uma discussão necessária é a escolha da modalidade de contratação.

É preciso analisar se o formato escolhido proporciona a possibilidade de fiscalização e privacidade dos dados a serem tratados em determinados setores.

Para que se compreenda a questão, basta um exemplo simples: se terei uma determinada função em minha empresa em que a pessoa, ou a empresa que irá exercer, terá acesso a todos os dados pessoais e sensíveis dos meus colaboradores e/ou clientes, qual modalidade de contratação irá proporcionar maior segurança ao empregador?

Em ambas as possibilidades surgem novos pontos de atenção que precisam ser ajustados no momento da contratação, seja via contrato regulamentado pelo Código Civil, ou por uma contratação regulamentada pela CLT.

Término do tratamento de dados

O artigo 15 da LGPD prevê que o término do tratamento de dados pessoais ocorrerá nas seguintes hipóteses:

I – Verificação de que a finalidade foi alcançada ou de que os dados deixaram de ser necessários ou pertinentes ao alcance da finalidade específica almejada; (controlador)

II – Fim do período de tratamento; (controlador ou lei, regimento)

III – Comunicação do titular, inclusive no exercício de seu direito de revogação do consentimento conforme disposto no § 5º do artigo 8º desta lei, resguardado o interesse público; (titular)

IV – Determinação da autoridade nacional, quando houver violação ao disposto nesta lei.

Considerações finais

A autoridade responsável pela fiscalização da LGPD será a ANPD – Autoridade Nacional de Proteção de Dados. Contudo, a fiscalização não está restrita à ANPD e poderá ser exercida por outras entidades fiscalizadoras, como os órgãos de proteção ao trabalhador (MPT, MPF, Auditor Fiscal etc.).

Estão entre as sanções administrativas para a prática de infrações à LGPD a aplicação de advertências, de multas simples ou diárias que podem chegar à quantia expressiva de R$ 50 milhões, e ainda publicização da infração e bloqueio e eliminação dos dados pessoais.

Como elencado nos próprios fundamentos da LGPD, esta tem como escopo a garantia das liberdades e direitos fundamentais da pessoa humana (já previstos no artigo 5º da CF/88), bem como o uso de dados pessoais (sensíveis ou não) com o propósito de trazer segurança jurídica tanto para quem fornece os dados (titular) quanto para aqueles que captam esses dados (controlador/operador).

A adequação à LGPD é de extrema urgência, posto que as relações de coleta e armazenamento de dados são praticamente diárias e estão, a partir de então, sujeitas às regulamentações previstas na LGPD.

Dentro do cenário das relações trabalhistas, como vimos, as mudanças também adquirem contornos específicos, principalmente durante a vigência do contrato de trabalho, com atenção especial aos contratos já vigentes antes da promulgação da LGPD.

A adequação à LGPD passará pela existência de boas práticas, treinamentos, normas internas e revisão de contratos e manuais a fim de garantir que os controladores busquem se adequar à lei visando minimizar ou mesmo eliminar os riscos de não observância aos preceitos da Lei Geral de Proteção de Dados.

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