A controvérsia gira em torno da aplicação de multa isolada de 50% (cinquenta por cento) sobre o valor do débito objeto de declaração de compensação não homologada, prevista no § 17 do art. 74 da Lei n. 9.430/96.
Com a transmissão da DCOMP, a Receita Federal do Brasil tem o prazo de cinco anos para analisar a compensação pleiteada pelo contribuinte, nos termos do artigo 74, §5º, da lei 9.430/96, cuja análise pode resultar em homologação tácita do pedido, emissão de Despacho Decisório com a homologação total do pedido, ou a emissão de Despacho Decisório para a não homologação parcial ou total do crédito pleiteado.
Faz-se necessário mencionar também que uma vez negada a homologação de compensação de débito tributário, o contribuinte não pode reiterar o pedido em relação ao mesmo débito, ainda que apresente crédito fiscal distinto, conforme decidiu a Segunda Turma do STJ, para a qual não se admite nova declaração de compensação tributária de débito que já tenha sido objeto de compensação anterior não homologada, nos termos do artigo 74, parágrafo 3º, inciso V, da Lei 9.430/1996.
A Discussão sobre a inconstitucionalidade da multa de 50% perdura desde 2013 e é objeto de Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI)nº 4.905[1] e Recurso Extraordinário n. 796.939/RS[2], no Supremo Tribunal Federal e somente em 2020 o julgamento teve seu início em plenário virtual, que por sua vez sofreu a interrupção por pedido de destaque do Min. Luiz Fux, o que ocasionou a necessidade de julgamento de forma presencial.
Do Início do Julgamento – Posicionamento do Relator pela Inconstitucionalidade da Multa.
Nesta oportunidade, o Relator do caso, Ministro Edson Fachin, entendeu pela inconstitucionalidade da multa em questão, sugerindo a fixação da seguinte tese:
“É inconstitucional a multa isolada prevista em lei para incidir diante da mera negativa de homologação de compensação tributária por não constar em ato ilícito com aptidão para propiciar automática penalidade pecuniária”.
A penalidade da multa isolada no percentual de 50% passou a ser imposta com as alterações promovidas pela Lei n. 12.249/2010, onde até então, em casos de não homologação, o contribuinte tinha a incidência de multa moratória limitada a 20%.
Desde meados de 2020, quando ocorreram as primeiras decisões sobre o tema no plenário virtual, os contribuintes obtiveram votos favoráveis tanto no RE quanto na ADI, até o mencionado pedido de destaque.
Em discussão em ambas as Ações, está a violação do direito de petição, em face da impossibilidade do contribuinte solicitar a compensação e ser compelido ao recolhimento de multa no caso de indeferimento do seu pedido caracterizando notório efeito confiscatório do tributo.
Após ser pautado para o Plenário físico em junho, os processos não foram julgados por falta de tempo, dependendo, agora, de nova pauta a ser indicada pela atual Presidente, Ministra Rosa Weber.
Ato contínuo e colaborando já para o cenário favorável aos contribuintes, o Ministério Público Federal apresentou parecer favorável à declaração de inconstitucionalidade da multa isolada.
Do Posicionamento no Âmbito Administrativo e Judicial sobre a Matéria.
Pois bem, enquanto aguardamos a decisão do STF, os contribuintes estão se valendo da esfera administrativa e judicial para reverter a aplicação desta multa; tal excesso de medidas deixa latente a insegurança jurídica, haja vista o conteúdo das decisões proferidas que pendem para ambos os lados.
No âmbito administrativo, por exemplo, apesar das discussões, o momento atual ainda é de limitação à possibilidade de afastamento da incidência de normas sob argumento de inconstitucionalidade, conforme sumulado pelo CARF:
Súmula CARF nº 2: O CARF não é competente para se pronunciar sobre a inconstitucionalidade de lei tributária.
Em que pese o Conselho Administrativo de Recursos Fiscais ser um tribunal mais “técnico”, onde questões específicas dos contribuintes são analisadas com mais cautela, é bem verdade que a limitação da legislação do próprio tribunal é tendenciosa a afastar esta discussão do âmbito administrativo.
Já no âmbito judicial, ainda que nas instâncias inferiores ocorram discordâncias dos precedentes das Cortes Superiores, o que se enxerga é uma tendência a uniformização de acordos com o parcial posicionamento proferido pelos Ministros, que tendem a confirmar a inconstitucionalidade da multa objeto da discussão.
Nada mais instável e inseguro para o contribuinte se utilizar de previsão legal que lhe permite usar créditos tributários para compensar com outros tributos e na mesma via e disposição legal aplicar punição em eventual indeferimento do pedido.
É o que se verifica nos casos de tributos sujeitos ao lançamento por homologação nos termos do art. 150 do Código Tributário Nacional, por exemplo, o qual prevê a existência de “tributos cuja legislação atribua ao sujeito passivo o dever de antecipar o pagamento sem prévio exame da autoridade administrativa”, a quem cabe, tomando conhecimento da atividade assim exercida pelo obrigado, expressamente a homologar, evento que se opera tacitamente com o decurso do interregno de 5 (cinco) anos.
De igual sorte em relação à compensação tributária, ao delegar ao contribuinte a realização de determinadas atividades, que em outros cenários imbuídas exclusivamente à autoridade fiscal, ao passo que dá agilidade ao sistema, também possibilita a ocorrência de fraudes ou utilização inadequada das ferramentas postas à disposição, trazendo a possibilidade de enormes danos à coletividade.
O objetivo, portanto, é o de punir o contribuinte que, se valendo dos benefícios advindos da apresentação da Declaração de Compensação, o faça em ofensa aos ditames normativos que regulamentam o procedimento.
Por fim, em razão do costumeiro posicionamento de nossas Cortes Superiores, cumpre ressaltar a possibilidade de modulação dos efeitos da decisão, que poderá ser aplicada apenas para o futuro e para aqueles que protocolaram a competente medida judicial antes do início do julgamento, sendo de incontestável recomendação aos contribuintes interessados nessa discussão que agilizem o ajuizamento de medida judicial.
Escrito por: Fernando Piffer.
[1] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4357242
[2] https://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4531713