prints são provas? existe outro meio de atestar a veracidade além da ata notarial?

Com o uso maciço das redes sociais, internet, ferramentas de comunicação, aplicativos e outros modos de comunicação, é comum a visualizações de mensagens, vídeos e publicações que soam ofensivas, o que poderia desencadear questões na esfera intima das pessoas jurídicas ou físicas.

Além de tais questões ofensivas, cada vez mais aumenta-se o uso indevido de imagens, fotos e marcas sem qualquer autorização de seu titular, caracterizando também abuso por parte dos infratores.

Com a população mundial necessitando estar mais em sua casa, muitas violações, xingamentos e fraudes migraram para o mundo virtual. Logo, muitas pessoas ao verificar algum ilícito, a primeira e única atitude de muitos usuários é apenas de “printar” a tela do celular ou do computador e, após um período, questionar o advogado sobre a possibilidade de entrar com algum tipo de ação e as medidas judiciais cabíveis.

Em um primeiro ponto, é importante destacar que para a simples remoção de conteúdos ofensivos, basta a indicação da URL (link) do conteúdo e o print anexado na ação judicial para comprovar as alegações, não necessitando de maiores produções probatórias nestes casos, nos termos do art. 19 do Marco Civil da Internet:

Art. 19. Com o intuito de assegurar a liberdade de expressão e impedir a censura, o provedor de aplicações de internet somente poderá ser responsabilizado civilmente por danos decorrentes de conteúdo gerado por terceiros se, após ordem judicial específica, não tomar as providências para, no âmbito e nos limites técnicos do seu serviço e dentro do prazo assinalado, tornar indisponível o conteúdo apontado como infringente, ressalvadas as disposições legais em contrário.

§ 1º A ordem judicial de que trata o caput deverá conter, sob pena de nulidade, identificação clara e específica do conteúdo apontado como infringente, que permita a localização inequívoca do material.

Assim, em ações mais simples e que não envolvam danos morais, marcas e comprovação de autoria do ilícito, muitas vezes apenas a URL com a tela da publicação é suficiente para suprir a demanda e os anseios das partes. Veja que tal questão é amplamente aplicada nos Tribunais desta federação:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C INDENIZAÇÃO POR DANOS MORAIS. DECISÃO QUE DEFERIU A TUTELA ANTECIPADA. PUBLICAÇÃO OFENSIVA EM REDE SOCIAL ADMINISTRADA PELA AGRAVANTE (“FACEBOOK”). ORDEM JUDICIAL QUE DETERMINOU A EXCLUSÃO DO CONTEÚDO. NECESSIDADE DE INDICAÇÃO CLARA E ESPECÍFICA DAS RESPECTIVAS URL’S, NOS TERMOS DO ART. 19, § 1º, DO MARCO CIVIL DA INTERNET. INOBSERVÂNCIA. CIRCUNSTÂNCIA QUE TORNA IMPOSSÍVEL O CUMPRIMENTO DA OBRIGAÇÃO. PRECEDENTES. DECISÃO REFORMADA. “(.) (…) 4. Necessidade de indicação clara e específica do localizador URL do conteúdo infringente para a validade de comando judicial que ordene sua remoção da internet. O fornecimento do URL é obrigação do requerente. Precedentes deste STJ. 5. A necessidade de indicação do localizador URL não é apenas uma garantia aos provedores de aplicação, como forma de reduzir eventuais questões relacionadas à liberdade de expressão, mas também é um critério seguro para verificar o cumprimento das decisões judiciais que determinarem a remoção de conteúdo na internet. 6. Em hipóteses com ordens vagas e imprecisas, as discussões sobre o cumprimento de decisão judicial e quanto à aplicação de multa diária serão arrastadas sem necessidade até os Tribunais superiores. 7. O Marco Civil da Internet elenca, entre os requisitos de validade da ordem judicial para a retirada de conteúdo infringente, a “identificação clara e específica do conteúdo”, sob pena de nulidade, sendo necessária a indicação do localizador URL. (…)”. (REsp 1.629.255/MG, rel. ª Min.ª Nancy Andrighi, Terceira Turma, j. 22.08.2017). RECURSO CONHECIDO E PROVIDO.

(TJ-SC – AI: 40129027820178240000 Itapema 4012902-78.2017.8.24.0000, Relator: Jorge Luis Costa Beber, Data de Julgamento: 09/11/2017, Primeira Câmara de Direito Civil)

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO INDENIZATÓRIA. OBSCURIDAE. SANEAMENTO. ORDEM DE REMOÇÃO DE CONTEÚDO OFENSIVO. NECESSIDADE DE INDICAÇÃO DA URL VÁLIDA E ESPECÍFICA DA PÁGINA EM QUE INSERIDO. Apontada a existência de obscuridade no acórdão embargado, deve ser sanado o vício a fim de esclarecer a questão. Conforme dispõe o art. 19, § 1º, da Lei nº 12.965/14, há necessidade de indicação do endereço eletrônico válido onde foram postados os conteúdos que a parte agravada pretende a remoção. EMBARGOS DECLARATÓRIOS ACOLHIDOS, SEM EFEITO INFRINGENTE.

(TJ-RS – EMBDECCV: 70082984121 RS, Relator: Eugênio Facchini Neto, Data de Julgamento: 20/11/2019, Nona Câmara Cível, Data de Publicação: 22/11/2019)

Agora imaginemos a situação que envolva a comprovação de publicação do conteúdo, que se discuta o dano moral, uma difamação, envio de mensagens indevidas e dentre outras situações mais complexas (como uso indevido de marca ou propriedade intelectual).

Apenas o “printar”, atitude corriqueira e mais imediata dos usuários, da tela dos aparelhos é correta, mas não deve ser única para o ajuizamento de uma ação. Conforme será demonstrado, meramente a tela, o print é uma prova sem muita comprovação jurídica e apenas a sua juntada pode ser determinante entre a procedência da ação ou não.

Para que apenas o print tenha força probante, sem que seja comprovada a sua veracidade em etapas antes da ação, muitas vezes é necessária a anexação de outras provas que podem ser custosas do ponto de vista monetário e podem postergar o regular andamento da ação.

Veja que em uma ação judicial, o juiz ou o requerido (ré) podem solicitar a perícia no aparelho (computador ou celular) para atestar a veracidade do conteúdo demonstrado no print, o que pode tornar a ação mais morosa. Tal atitude que pode parecer exagerada para muitos é o que garante a segurança da mensagem.

Imagine o caso de alguém ajuizar algumas ações arguindo a cobranças indevidas via aplicativo WhatsApp ou algum comerciante arguir que o alguém ou algum concorrente esteja usando indevidamente a sua marca, agora imagine que as telas foram montadas para comprovar tal direito? Estar-se-ia a causar verdadeiras injustiças caso o juiz, ou o próprio réu, não exigisse provas mais robustas.

Ante a fácil manipulação das imagens pelo usuário, a cópia meramente da tela torna-se uma prova fraca do ponto de vista jurídico. Em que pese o art. 369[1] do Código de Processo Civil expressar que cabem as partes empregar todos os meios legítimos, ao juiz cabe a sua valoração para verificar se o direito é cabível ou não.

Logo, a captura da tela pode ser modificada antes de sua apresentação em juízo e sua comprovação nos autos, por meio de perícia ou prova testemunhal, pode tornar o processo moroso e mais custoso.

Antes do avanço dos usos tecnológicos e das Lawtechs (aplicativos ou softwares criados para desburocratizar e aperfeiçoar o judiciário em sentido amplo) o mais usual era a confecção de ata notarial para comprovar a existência e validade do print.

A Ata notarial, para ser confeccionada, deve a parte ou o advogado comparecer ao cartório de notas. A Ata nada mais é que a representação da expressão de algo sem qualquer juízo de valor realizada pelo cartorário. Nas palavras de Paulo Ferreira:

“Ata notarial é o instrumento público pelo qual o tabelião, ou preposto autorizado, a pedido de pessoa interessada, constata fielmente os fatos, as coisas, pessoas ou situações para comprovar a sua existência, ou o seu estado.”[2]

A Ata Notarial é prova e possui força probante maior que meramente o print de uma tela, visto que a atestado por cartório que o conteúdo é visto como tal pelo cartorário. O art. 384 do Código de Processo é expresso neste sentido:

Art. 384. A existência e o modo de existir de algum fato podem ser atestados ou documentados, a requerimento do interessado, mediante ata lavrada por tabelião.

Parágrafo único. Dados representados por imagem ou som gravados em arquivos eletrônicos poderão constar da ata notarial.

Logo, muitas empresas e pessoas começaram a adotar a Ata Notarial para comprovar uma imagem capturada na internet, ensejando maior validade jurídica aos fatos. Vejam que tal prova é valorado pelo Tribunal de Justiça de São Paulo:

APELAÇÃO – AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER CONSUBSTANCIADA EM FORNECER PLANO NACIONAL – INEXISTÊNCIA DE PRODUTO – PROVA DIABÓLICA – INEXISTÊNCIA – Prova que poderia ser produzida com a simples juntada dos produtos oferecidos pelo grupo, inclusive com a confecção de ata notarial que emprestaria força probante a print de tela – Ré que, entretanto, nem juntou documentos nesse sentido, nem requereu produção de provas, denotando desinteresse total na instrução – Dificuldade que poderia ser superada, mas não o foi por negligência da parte – Sentença mantida – Recurso desprovido.

(TJ-SP – AC: 10178407020188260100 SP 1017840-70.2018.8.26.0100, Relator: Costa Netto, Data de Julgamento: 29/05/2019, 6ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 29/05/2019)

Ação de obrigação de fazer c.c. indenização por danos morais. Sentença de improcedência. Compra e venda de aparelho televisor pela internet. Controvérsia acerca da própria existência do negócio jurídico. Ausência de prova acerca do “site” em que realizado o negócio. “Print” de tela admissível como possível indício, cuja prova contundente exigia a elaboração de ata notarial (art. 384, CPC). Fraude em ambiente virtual (“phishing”), do qual sobreveio alteração do código de barras do boleto para pagamento. Impossibilidade de atribuição de responsabilidade à ré por fato de terceiro. Sentença mantida. Apelo improvido.

(TJ-SP – AC: 10078536920178260609 SP 1007853-69.2017.8.26.0609, Relator: Soares Levada, Data de Julgamento: 26/10/2018, 34ª Câmara de Direito Privado, Data de Publicação: 26/10/2018)

Contudo, a produção da Ata Notarial não é barata e a depender da ocorrência do fato, ela pode se tornar ineficaz. Quanto aos valores, o preço praticado pelos Tabelionatos no Estado de São Paulo[3] é de R$ 466,87 (quatrocentos e sessenta e seis reais e oitenta e sete centavos) somente a primeira página e o valor de R$ 235,75 (duzentos e trinta e cinco reais e setenta e cinco centavos) pelas páginas adicionais, o que torna muito caro para a maioria da população a sua produção.

Assim, a depender do tamanho do conteúdo a ser transcrito e demonstrado, o valor da Ata Notarial pode ser superior a R$ 1.000,00 (mil reais). Outro percalço da Ata Notarial é a necessidade de algumas vezes levar o aparelho que contenha a imagem para a sua confecção pelo cartorário, além da parte se atentar ao horário de funcionamento dos cartórios de notas.

Outro problema da produção da Ata Notarial existe ante a dinamicidade da internet, visto que um conteúdo postado ou mensagem enviada pode ser apagado em questão de horas ou minutos, deixando a única comprovação da violação do direito perecer e a produção da prova custosa.

Verificando a fragilidade da questão e dos altos custos para a Ata Notarial, surgiram lawtechs que possuem o objetivo de desburocratizar e baratear a produção destes tipos de provas com a mesma validade probatória das Atas Notariais.

Antes de adentrar as novas ferramentas que tornam o processo mais rápido e barato da captura de telas, os artigos 369 em conjunto com o art. 411 do Código de Processo Civil, considera que um documento possa ser considerado autêntico quando estiver identificado por qualquer outro meio de certificação:

Art. 411. Considera-se autêntico o documento quando:

(…)

II – A autoria estiver identificada por qualquer outro meio legal de certificação, inclusive eletrônico, nos termos da lei;

Com a Pandemia do Covid-19, muitos advogados, operadores do direito e pessoas físicas/jurídicas ficaram impossibilitadas de confeccionar a Ata Notarial, visto a perda do poder aquisitivo ou a necessidade de comparecer ao cartório, começaram a surgir novas ferramentas que tornam mais ágil a validade da captura de tela.

Atualmente, a ferramenta mais utilizada é conhecida como Verifact, cujo papel é o registro online de fatos ocorridos na internet, com a mesma confiança e integridade dada à Ata Notarial. Também existem outros aplicativos que fazem a mesma função, como a OriginalMy.

Essas ferramentas registram as telas de forma remota sem que existam contaminações das imagens, e-mail, mensagem, conteúdos, dentre outros, assegurando e garantindo a integridade pelo uso do HASH[4]. Além de outros meios de assegurar a sua integridade e anterioridade, utiliza-se certificados ICP/BRASIL para garantir mais segurança.

Logo, os usuários ao verificarem alguma situação na internet, podem remotamente, de forma rápida e menos custosa, garantir a validade e a integridade da imagem a ser capturada.

Seguindo as tendências desta nova ferramenta, que pode ser utilizada por qualquer pessoa, o Ministério Público da Bahia decidiu utilizar-se dela para a captura de provas digitais, tornando o processo mais barato e ao mesmo tempo mais ágil. No mais, outras delegacias e órgãos já a utilizam. Para tanto, recorta-se trecho de reportagem publicada no Conjur sobre o assunto:

De acordo com a CEO e cofundadora da empresa de tecnologia, Regina Acutu, a Verifact permite o registro instantâneo da prova que, entre tantas funcionalidades, poderá ser utilizada contra os chamados haters da internet — ainda que as informações ofensivas venham a ser removidas mais tarde. “E tudo isso pode ser feito por um valor 20 vezes menor que o preço cobrado pela ata notarial em vários Estados do Brasil”, diz Regina.

(…)

Avaliada por juristas como “material de alta confiança probatória quanto à sua existência, origem e autenticidade”, a Verifact vem sendo cada vez mais utilizada e recomendada por advogados e investigadores de polícia. A ferramenta é citada, inclusive, no Manual de Interceptação Telefônica e Telemática do renomado delegado Higor Jorge, da Polícia Civil de São Paulo.

“A Verifact é uma plataforma on-line que permite a captura e a preservação de técnica de fatos ocorridos no ambiente online (…), automatizando práticas comuns na área forense digital e medidas técnicas efetivas contra fraude e manipulação no processo de registro”, diz Higor Jorge nas páginas 134 e 135 de seu livro.

Portanto, ao verificar algum ilícito na internet, o ideal é contatar imediatamente o seu advogado para garantir a prova e sua integridade, o qual saberá o melhor meio para a questão. Na impossibilidade de contato, tentar utilizar tais ferramentas para garantir a sua integridade e, não sendo possível, tentar obter outras provas além do print a ser capturado.

Logo, o print pode ser meio de prova, mas ante a possibilidade de manipulação da imagem, ela é uma prova frágil e, a depender da complexidade da ação, ela deve ser evitada, devendo ser utilizada outras ferramentas ou a produção da Ata Notarial para dar robustez a prova.

Referências:

A vítima de xingamentos na internet e as providências que devem ser tomadas

Prints de Conversas no WhatsApp servem como prova em ação judicial?

Não apague as suas mensagens de Whatsapp, elas podem ser usadas como prova!

MP da Bahia assina acordo técnico para registro de provas digitais

Fundamentação

Startup combate impunidade no meio digital dando agilidade ao registro de provas


[1] Disponível em: Art. 369. As partes têm o direito de empregar todos os meios legais, bem como os moralmente legítimos, ainda que não especificados neste Código, para provar a verdade dos fatos em que se funda o pedido ou a defesa e influir eficazmente na convicção do juiz.

[2] FERREIRA, Paulo Roberto Gaiger; RODRIGUES, Felipe Leonardo. Ata Notarial – Doutrina, prática e meio de prova, p. 112. São Paulo: Quartier Latin, 2010.

[3] Disponível em: https://www.1cartoriosjc.com.br/?pG=X19wYWdpbmFz&idPagina=73

[4] Conforme site do Wikipedia “Um hash (ou escrutínio) é uma sequência de bits geradas por um algoritmo de dispersão, em geral representada em base hexadecimal, que permite a visualização em letras e números (0 a 9 e A a F), representando um nibble cada. … Essa sequência busca identificar um arquivo ou informação unicamente.”.

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