“QUIET QUITTING”, “QUIET FIRING” E AS POSSÍVEIS IMPLICAÇÕES TRABALHISTAS

 

Um dos assuntos mais comentados nos últimos meses no âmbito das relações de trabalho é o chamado “quiet quitting”, conhecido como “desistência silenciosa”, que nada mais é do que o colaborador fazer o mínimo possível das obrigações exigidas no cargo, com o objetivo de estabelecer limites, proteger a própria saúde mental e, quem sabe, conseguir com que a empresa proceda com a extinção do contrato de trabalho por iniciativa própria.

Em contrapartida, também ganhou destaque o “quiet firing”, que seria uma atitude reativa por parte das empresas e seus respectivos gestores em relação ao “quiet quitting”. No caso do “quiet firing”, ocorre uma série de ações promovida pela liderança no ambiente de trabalho que visa ocasionar o pedido de demissão do empregado, como por exemplo, corte de promoções, ausência de “feedbacks”, mudanças repentinas nas demandas, dentre outras medidas que tornam a relação insustentável.

Essa nova moda pode se tornar mais um grande desafio para o setor de recursos humanos das organizações (https://veiga.law/2022/08/16/os-desafios-do-pos-pandemia-na-area-de-recursos-humanos/), já que tais práticas influenciam na cultura da empresa e podem ensejar discussões na Justiça do Trabalho.

Com relação ao “quiet quitting”, por mais que a ideia seja, a princípio, atrair a atenção do empregador para um possível descontentamento e, quem sabe, ser dispensado sem justa causa de modo que não haja renúncia ao valor de nenhuma verba, deve-se lembrar que a linha entre o que configura ou não uma dispensa por justa causa é bem tênue.

Isso porque a CLT, em seu art. 482, alínea “e”, traz como motivo para aplicação de justa causa a chamada desídia, que é o ato de realizar as atividades profissionais com desinteresse e de maneira relapsa, o que parece estar bastante relacionado às condutas incentivadas pelo “quiet quitting”. O mesmo dispositivo traz na alínea “h” a possibilidade de justa causa para ato de indisciplina ou de insubordinação, o que também pode ser encaixado na situação em debate.

Destaca-se, ainda, que o art. 456, parágrafo único, da CLT, dispõe que “(…) entender-se-á que o empregado se obrigou a todo e qualquer serviço compatível com a sua condição pessoal”. Portanto, mais uma vez é imprescindível se atentar à questão da insubordinação, já que “fazer o mínimo” pode trazer consequências além daquelas que são esperadas.

Vale ressaltar que, por se tratar de uma medida extrema, a dispensa por justa causa deve sempre ser analisada de maneira individual, com foco nas peculiaridades do caso concreto e, se possível, com o auxílio de um advogado, já que a falta grave deve estar enquadrada nos requisitos da legislação trabalhista.

Contudo, de rigor salientar que a possível aplicação de uma justa causa para casos de “quiet quitting” não significa que a empresa não deva se atentar aos descontentamentos expostos e a situações que podem refletir na saúde mental de seus colaboradores (https://veiga.law/2022/09/28/setembro-amarelo-a-sindrome-de-burnout-e-o-papel-das-empresas-diante-dela) uma vez que o empregador tem o dever de zelar pelo bom ambiente laboral e acontecimentos ruins, nas mais diversas esferas, podem ensejar não só uma indenização, mas também a chamada rescisão indireta do contrato de trabalho, cuja previsão está no art. 483 da CLT.

E por falar em rescisão indireta, o “quiet firing”, por sua vez, também pode trazer consequências às empresas, uma vez que pode ocasionar a “falta grave do empregador”, pois, ao impor ao trabalhador o ócio forçado, sem designar atribuições a serem realizadas por dias ou mesmo meses, a empresa claramente extrapola os limites de seu poder diretivo de forma abusiva e em afronta à dignidade da pessoa humana do empregado, a qual tem no desempenho de sua capacidade produtiva o valor dignificante do trabalho.

Desta maneira, configurada a rescisão indireta do contrato de trabalho, o empregado tem direito a receber todas as verbas rescisórias, como teria em uma dispensa padrão sem justa causa. Além disso, nesse cenário, a Justiça do Trabalho costuma arbitrar indenização por danos morais nos mais diversos valores, com fundamento no princípio da dignidade da pessoa humana – art. 5º da Constituição Federal – acima mencionado.

Diante do exposto, a forma mais efetiva de resolver conflitos, tanto do lado do empregado, como do lado do empregador, é insistir no diálogo, em “feedbacks” estruturados e na transparência das relações de trabalho, através da instituição de políticas éticas e francas entre todos os envolvidos.

[1] https://valor.globo.com/carreira/noticia/2022/09/23/quiet-firing-entenda-a-resposta-das-empresas-ao-quiet-quitting.ghtml

Escrito por: Carolina Tavares

 

 

 

 

 

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