Embora conte com quase 50 anos de existência, o Compliance ainda se mostra como uma área que precisa ser mais bem entendida para alcançar seu verdadeiro benefício. Criada por conta de uma crise de corrupção nos anos 70 e, no Brasil, foi internalizada com a assinatura do Acordo de Cooperação Intergovernamental – Decreto nº 8.506/15.
Compliance se traduz em um conjunto de regras para finanças e corporação; comércio e mercados; gestão de investimentos, análise econômica de riscos e, também, em conformidade tributária; por este motivo é impreterível que as empresas estejam atentas aos cumprimentos das regras de Governanças e, em especial, ao movimento do Fisco no que refere à Fiscalização dos Contribuintes.
Em 2022 temos como os itens mais fiscalizados as Notas Fiscais não escrituradas e a quebra de sequência na emissão de Notas próprias – um procedimento que pode parecer simples, mas que, em verdade, reside em um grande “calcanhar de Aquiles” para a maioria dos Contribuintes uma vez que, a não escrituração de Notas Fiscais implica em quebra de Regulamento do ICMS, possível falta de aproveitamento de créditos e, fora desta esfera tributária, possível problemas com o fornecedor.
É comum que as Notas Fiscais inutilizadas não sejam canceladas junto ao Fisco, chamando uma grande atenção para qualquer possível falha no controle e governança praticada pelo Contribuinte.
Ao falarmos de Compliance, é necessário entendermos que, no Brasil, vamos além do FCPA (Foreign Corrupt Practices Act) e do Bribery Act – inclusive, mais severos que nossas regras nacionais – porém nosso complexo sistema tributário exige que as empresas estejam devidamente capacitadas e organizadas a revisar suas próprias atividades – com time próprio ou terceirizados.
Claramente as empresas hoje necessitam se munir não só de boa capacidade técnica, mas também de informações suficientemente bem analisadas para evitar não somente o contencioso tributário, mas também evitar pagamento a maior, duplicados ou atemporais – desde que houve a promulgação da nossa Constituição Federal – em 1988 – o Brasil conta com 377 mil normas tributárias editadas – sendo 32 mil só no âmbito federal – não é em vão que nosso sistema tributário é considerado um dos mais complexos do mundo e que seu respectivo Compliance mereça uma atenção especial e time qualificado.
Neste sentido, um dos cenários mais comumente encontrados se refere a diferença entre as obrigações acessórias entregues pelo próprio contribuinte, como, por exemplo EFD X GIA, ou DCTF X ECD – tais inconsistências não são só evitáveis, como também apuráveis pelo próprio Contribuinte ao contar com uma equipe especializada que possa realizar esse crosscheck e apontar não somente as diferenças, mas também como ajustá-las e, possivelmente, evitá-las num futuro próximo.
Infelizmente, diferente de outros países, não há nenhum tipo de penalidade prevista aos Auditores Fiscais que exercem a fiscalização do poder de tributar do Estado – contando com 135,31 Bilhões de Reais divididos em 265.350 processos administrativos somente nas Delegacias da Receita Federal (ou seja, excluindo os processos Estaduais e Municipais), a lavratura de Autos de Infração e Imposição de Multa não só é um receio da maioria dos Contribuintes, como também é um ato administrativo que, mesmo sem análise minuciosa dos fatos e documentos, pode acontecer sem nenhum prejuízo para o Fisco.
O Compliance Tributário, quando bem-feito, evita o risco de questionamentos, uma vez que, o cruzamento de informações que tem como resultado consistências tende a não ser questionado e, portanto, fiscalizado.
Apresentado recentemente pelo TCU – Tribunal de Contas da União, o relatório de “Conclusões técnicas dos trabalhos realizados na gestão Tributária Federal” deixa claro como, mesmo havendo falhas por parte da administração pública, o contencioso tributário vem crescendo no Brasil – são R$ 2,32 trilhões de Reais divididos em 17 milhões de “certidões de Dívidas Ativas Federais – os números refletem sim um excesso e facilidade de Autuações, mas nos remete a quantidade de falhas passíveis pelo Contribuinte.
Na esfera Estadual e Municipal a consolidação de dados se torna quase impossível, isso porque parte dos Estados e Municípios sequer estão devidamente automatizados com relação ao contencioso tributário – mas verificam o Compliance de seus Contribuintes ativamente – com destaque a esfera Estadual, onde comumente as Secretarias da Fazenda Estaduais vem comunicando a Promotoria Estadual para abertura de investigações criminais- e possíveis processos pelo suposto não pagamento de tributo.
A Lei 8.137/90 em seu art. 1º e 2º traz os tipos penais contra a Ordem Tributária, e, de fato, há crimes de sonegação fiscal que, pela letra da Lei, pode ser oriundo da falta de diligência na realização do Compliance, uma vez que a inexatidão de Declarações, por exemplo, é uma infração fiscal passível de ser classificada como sonegação – ao levar isso em conta, em 2020 o IBPT (Instituto Brasileiro de Planejamento e Tributação) calculou R$ 417 bilhões de Reais classificados como sonegados – isso demonstra a disparidade e dificuldade dos Contribuintes em realizar suas obrigações principais e acessórias.
É importante ter em mente que o Brasil é um dos países com a tecnologia tributária mais avançada do mundo, bem como um dos maiores países com arrecadação sob litígio – não é difícil depreender a conexão existente entre essas duas informações, qual seja, a informatização e avanço tecnológico do Fisco tem gerado fiscalização, autuações e, consequentemente, maior gasto para o Contribuinte.
Se torna imprescindível que o Compliance tributário seja visto como uma vantagem competitiva para as empresas, a utilização de equipe especializada em identificar e evitar falhas nos procedimentos internos não só é um ganho para a empresa que adota essa visão e política, como um benefício social em não permitir que o erário se sobrecarregue.
Responsabilidade tributária atribuída aos Marketplaces e as medidas preventivas oriundas do Compliance
Em linha com o entendimento acima exposto, é de se ressaltar que no Estado do Rio de Janeiro houve a publicação de uma norma[1] atribuindo a responsabilidade tributária aos Marketplaces pelo não recolhimento de ICMS devido pelos lojistas cadastrados em sua plataforma.
A norma foi questionada por meio da Ação Direta de Inconstitucionalidade. ADIN nº 0040214-33.2020.8.19.0000, tendo os julgadores do TJRJ considerado a norma Constitucional, mantendo assim a responsabilização do Market Place por inadimplementos dos lojistas.
Caso essa decisão permaneça, é importante que o setor se movimente e logo, cabendo ao time de Compliance Tributário adotar medidas para mitigar os riscos operacionais neste modelo de negócio
Nossa equipe se coloca à disposição para eventuais esclarecimentos.
Escrito por Beatriz Perin
[1] Artigos 15 e 18 da Lei nº 8.795/2020