Antes de abordarmos os aspectos mais específicos da redução de capital social em si, cabe trazer alguns breves apontamentos conceituais sobre capital social, os quais serão importantes para garantir a completa compreensão do tema.
Como sabido, o capital social é representado por um valor constante no estatuto social formado pela contribuição dos sócios e pelas reservas da companhia possuindo uma existência de direito, e não de fato, somente podendo ser alterado por meio de Assembleia Geral nos casos e condições previstos em lei.
Assim, sob nenhuma interpretação, o capital social confunde-se com o patrimônio da sociedade que, por sua vez, é constituído pelo conjunto de bens, direitos e obrigações da companhia. Não à toa, no aspecto contábil sob a ótica do método de partidas dobradas, enquanto o capital social encontra-se tradicionalmente representado em uma conta alocada no passivo companhia sob a nomenclatura de “Patrimônio Líquido”, o patrimônio da sociedade representa o conjunto de valores, sejam eles ativos ou passivos, que compõe a companhia.
Desta forma, o capital social não mais representa necessariamente a correspondência entre o número de ações que se dividirá o capital social e o valor efetivo das entradas financeiras na Companhia, tendo como função externa uma espécie de garantia de estabilidade e possibilidade de cumprimento de obrigações frente a terceiros.
Da redução de capital social
Sobre a redução do capital social, o artigo 173 da Lei 6.404/76 nos diz o seguinte:
Art. 173. A assembléia-geral poderá deliberar a redução do capital social se houver perda, até o montante dos prejuízos acumulados, ou se julgá-lo excessivo.
- 1º A proposta de redução do capital social, quando de iniciativa dos administradores, não poderá ser submetida à deliberação da assembléia-geral sem o parecer do conselho fiscal, se em funcionamento.
- 2º A partir da deliberação de redução ficarão suspensos os direitos correspondentes às ações cujos certificados tenham sido emitidos, até que sejam apresentados à companhia para substituição.
Assim, podemos separar as hipóteses de redução do capital social em duas espécies: i) a redução real; e ii) a redução nominal, as quais serão expostas a seguir.
A redução nominal caracteriza-se pela realização de uma operação contábil de redução do valor do capital social em detrimento de um prejuízo existente na companhia, permanecendo o valor patrimonial da sociedade inalterado. Além disso, a deliberação da redução do capital social em função de perda ou prejuízo acumulado somente pode ser realizada após consumida a reserva legal, caso haja.
Nestes casos, a caracterização de um patrimônio líquido negativo é essencial para a redução do capital social em virtude de perdas, até inclusive para preservar o equilíbrio entre o capital e o patrimônio.
Em resumo, no caso de uma redução nominal por meio da utilização do prejuízo acumulado para tanto, não há uma transferência de ativos de nenhuma espécie, sendo realizado somente um ajuste contábil, baixando-se o capital social no valor correspondente a baixa do prejuízo acumulado, não sendo, portanto, uma alternativa efetiva à presente situação.
Por sua vez, a redução real caracteriza-se pela correspondência entre o valor reduzido do capital social e uma redução do patrimônio da sociedade, existindo uma restituição do excesso de capital aos acionistas, sendo que o motivo que leva à deliberação da companhia pela redução do capital social será pela racionalização da administração da companhia.
A caracterização do capital excessivo, fato que enseja a redução real do capital, apresenta-se pela não produtividade do capital social, passando este a tornar-se um encargo financeiro à sociedade, devendo ser tomada bastante atenção com relação à justificativa de sua redução.
Desta forma, na redução real do capital social há uma diminuição do patrimônio da sociedade, sendo que esta redução será inteiramente destinada aos acionistas com a consequente diminuição do lastro patrimonial da sociedade, sendo, portanto, uma alternativa viável à realização da presente operação pretendida pela Companhia, desde que observadas as nuances apresentadas neste documento.
Cabe mencionar brevemente que esta alteração não é contrária ao princípio da imutabilidade do capital social que, por sua vez, é definido por Carvalhosa[1] da seguinte forma:
O capital social não é formado por uma massa separada do patrimônio ou por uma parte do ativo da sociedade, mas configura-se como um débito diante dos acionistas, razão pela qual consta do passivo no balanço, ainda que não exigível.
Tendo que permanecer sem mudanças, a não ser que seja reduzido ou aumentado na forma devida, os lucros e os prejuízos do exercício não devem ser creditados ou diminuídos da conta do capital, mas colocados em posição especial no balanço.
Assim, a integridade e imutabilidade do capital social representa a garantia de cumprimento das obrigações assumidas pela companhia, sendo que sua mudança (aumento ou redução), dentro dos limites legais estabelecidos, não é contrário ao princípio da imutabilidade do capital social.
Competência de deliberação
A decisão de reduzir o capital social compete exclusivamente à Assembleia Geral, enquanto esta expressa por meio do voto de seus acionistas a vontade social, sendo que, uma vez observados os procedimentos previstos na Lei 6.404/76 e sendo adequadamente garantidos os direitos dos credores, a decisão de reduzir o capital social da Companhia classifica-se como matéria exclusiva da gestão da companhia – como já especificado –, não pode ser objeto de contestação por parte de terceiros como Junta Comercial e Comissão de Valores Mobiliários.
Do procedimento para a redução de capital
A redução de capital deverá ser deliberada em Assembleia Geral, devendo constar na ordem do dia da convocação, nos termos do artigo 124 da Lei 6.404/76, sendo que, por resultar em uma alteração do Estatuto Social da Companhia, o quórum de instalação será de, no mínimo, 2/3 do total dos votos[2], não se exigindo, no entanto, quórum qualificado para sua deliberação.
Não obstante, com a finalidade de proteção a credores da sociedade, o artigo 174 da Lei 6.404/76 estabelece alguns procedimentos adicionais que devem ser observados, quais sejam:
Art. 174. Ressalvado o disposto nos artigos 45 e 107, a redução do capital social com restituição aos acionistas de parte do valor das ações, ou pela diminuição do valor destas, quando não integralizadas, à importância das entradas, só se tornará efetiva 60 (sessenta) dias após a publicação da ata da assembleia-geral que a tiver deliberado.
- 1º Durante o prazo previsto neste artigo, os credores quirografários por títulos anteriores à data da publicação da ata poderão, mediante notificação, de que se dará ciência ao registro do comércio da sede da companhia, opor-se à redução do capital; decairão desse direito os credores que o não exercerem dentro do prazo.
- 2º Findo o prazo, a ata da assembleia-geral que houver deliberado à redução poderá ser arquivada se não tiver havido oposição ou, se tiver havido oposição de algum credor, desde que feita a prova do pagamento do seu crédito ou do depósito judicial da importância respectiva.
- 3º Se houver em circulação debêntures emitidas pela companhia, a redução do capital, nos casos previstos neste artigo, não poderá ser efetivada sem prévia aprovação pela maioria dos debenturistas, reunidos em assembleia especial.
Assim, considerando as disposições acima, os efeitos da redução de capital social somente se tornarão efetivas após 60 (sessenta) dias da publicação da ata de assembleia que tiver deliberado sobre a redução do capital social.
Por fim, a única ressalva é que deve ser tomado um cuidado especial com relação a esta espécie de movimentação, pois, caso não sejam analisadas as características e especificidades de cada caso, existe o risco da redução ser encarada pela Receita Federal como uma distribuição disfarçada de lucros, gerando a necessidade de explicações frente ao órgão responsável.
Nosso objetivo aqui é trazer informação aos nossos clientes e comunidade, no caso de qualquer dúvida, nossa equipe encontra-se à disposição para dirimir eventuais dúvidas.
[1] Carvalhosa, Modesto. Comentários à lei de sociedades anônimas, volume 3 – 6º ed. Rev. E atual. – São Paulo: Saraiva 2014 – p. 811
[2] Art. 135. A assembleia geral extraordinária que tiver por objeto a reforma do estatuto somente se instalará, em primeira convocação, com a presença de acionistas que representem, no mínimo, 2/3 (dois terços) do total de votos conferidos pelas ações com direito a voto, mas poderá instalar-se, em segunda convocação, com qualquer número.